127 – A identificação mais antiga.

Esta viagem do Trem de História, dedicada à Colônia Agrícola da Constança e à imigração em Leopoldina, traz a atualização de mais um capítulo da pesquisa publicada em 2010, quando se comemorou o Centenário da Colônia e o que se convencionou, com base nos estudos até ali desenvolvidos, ser os 130 anos da imigração italiana para Leopoldina.

Naquela época foi destacado que o primeiro jornal de Leopoldina, denominado O Leopoldinense, em 1881 noticiou a chegada de imigrantes espanhóis que Domiciano Ferreira Monteiro de Castro fizera embarcar da Corte para a Fazenda do Socorro, de propriedade do seu irmão Vicente Ferreira Monteiro de Barros.

O Relatório da Presidência da Província de 1882 registra a fala que Teófilo Otoni dirigiu à Assembleia Provincial de Minas Gerias, no dia 01 de agosto daquele ano, na qual abordou o tema Colonização. Os deputados foram informados de que, conforme previa o artigo 6º da Lei nº 2819, de outubro de 1881, a empresa John Pitty & Cia tinha sido contratada para introduzir 12.000 colonos nas lavouras da Província de Minas Gerais e que o processo havia sido iniciado no mesmo ano. Entre os contratantes citados no mencionado relatório, confirma-se a notícia do jornal O Leopoldinense. Aqueles espanhóis foram, no início da pesquisa, os registros mais remotos sobre a chegada de imigrantes em Leopoldina.

Não se conheciam os nomes nem qualquer informação adicional sobre os contratados. E mais tarde ficou evidente que os imigrantes espanhóis e portugueses dificilmente seriam identificados, dada a semelhança de nomes e sobrenomes e a falta de indicações nas fontes disponíveis para consulta.

Na medida em que avançava a leitura dos relatórios provinciais e de esparsos livros de notas dos cartórios do regime imperial, surgiram outras referências.

Embora houvesse um controle que praticamente impedia a entrada de estrangeiros no país, já no início do povoamento do Feijão Cru aparecem indícios da presença de ‘não portugueses’ aqui residentes. Em consulta às poucas fontes literárias existentes, surgiu um sobrenome que veio a ser identificado como sendo de Antoine Urbain Levasseur, que em 1838 respondeu ao censo populacional informando ser francês, solteiro, com 30 anos de idade. Além desta e até o final da década de 1870, eventuais referências a estrangeiros em Leopoldina são raras.

O panorama se modifica a partir das negociações empreendidas pelo governo provincial, com vistas a substituir a mão de obra escrava nas fazendas.

Com os primeiros incentivos, empresas foram constituídas com o fim precípuo de contratar imigrantes europeus. E eles começaram a chegar, alguns viajando por conta própria e se instalando na área urbana.

Quando a pesquisa foi encerrada, em 2010, haviam sido identificados alguns italianos não agricultores que chegaram por volta de 1880, o que levou os pesquisadores a considerar esse ano como sendo o do início do período de imigração italiana para Leopoldina. Época em que para cá vieram os Appratto, Cazzolino, Eboli, Pagano, Polito, Petrola, Savino e Tambasco que compunham o grupo de sobrenomes procedente da região da Campania.

Esta afirmação perdurou até 2016, quando veio o convite para um Seminário a ser realizado pelo Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais no ano seguinte. O trabalho para o Seminário no IHGMG, que recebeu o título “Savino: de Ispani para Leopoldina. A origem italiana de Fernando Sabino” e está disponível para leitura no site do jornal e no dos pesquisadores[1], assim como na Revista do IHGMG v.43 de 2018, abriu novos horizontes.

A divulgação do novo estudo despertou a atenção de pessoas que acompanham as publicações e entraram em contato buscando por outros italianos que teriam vivido em Leopoldina antes de 1880. A troca de mensagens trouxe dados que, somados a indícios anotados há mais de quinze anos, levaram à constatação de que desde a década de 1860 havia italianos negociantes estabelecidos em Leopoldina. E apontou o mais antigo sobrenome dessa primeira fase como sendo Vitrale. Uma descoberta que contou com a fundamental contribuição de Gilson Vitorino, um paulistano que descende de um dos filhos de Sebastiano Vitrale, italiano estabelecido na corte desde, pelo menos, 1868, que teve uma filha nascida em Leopoldina naquele ano.

Com a descoberta, o início da imigração italiana para Leopoldina passou a ser considerado como sendo na década de 1860, que será mencionada em textos próximos em que se tratará de algumas das centenas de famílias que cruzaram o Atlântico em busca de novas oportunidades e participaram intensamente da vida da cidade, modificando o panorama social, econômico e político.

Esgotada a lotação para a viagem de hoje, o Trem de História convida os leitores para a próxima viagem, quando serão embarcados mais aspectos da pesquisa publicada em 2010.

Nota 1: os trabalhos sobre história de Leopoldina são publicados em cantoni.pro.br

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 380 no jornal Leopoldinense de 16 de maio de 2019

92 – Savino # Sabino – Primeiro casamento de Nicola Savino

Nicola Savino casou-se a primeira vez com Angela Maria Grazia Appratto, filha de Vincenzo Appratto e Antonia Pagano, com quem teve seis filhos nascidos em Leopoldina. Após o falecimento da esposa, em 1891, Nicola viajou à Itália onde mandou transcrever os registros de batismo dos seis filhos e foram estes os registros encontrados nos livros do Tribunal de Sala Consilina no início das buscas para este trabalho.

Não se sabe se foi durante a estadia na Itália que Nicola se casou em segundas núpcias com Rosa Ana Giudice, com quem teve outros sete filhos, também nascidos em Leopoldina ou, se esta união se efetivou no Brasil após o retorno. Fato é que Nicola Savino faleceu em Leopoldina em 1914 deixando a viúva Rosa Ana com os seus sete filhos.

E como foi lembrado por seu neto, ele foi proprietário de um bar sobre o qual declarou Botelho:

“bar do Nicolau Sabino, o mais categorizado […] a fina sociedade ali se reunia […] O velho Nicolau Sabino era auxiliado pelos seus filhos […] Havia no bar uma taboleta que dizia assim; Perdute tuta esperanza quelle che entrata senza dinaro”(3)

Na relação de contribuintes de impostos no Município de Leopoldina para o exercício de 1897, publicada no jornal O Mediador, Nicola Savino aparece como proprietário de prédio urbano, hotel e oficina de sapateiro. O jornal O Arame acrescenta que existia um Tiro ao Alvo no Salão Recreio, de propriedade de Savino.

De sua primeira união, com Angela Maria Grazia Appratto, Nicola Savino deixou os seguintes filhos:

1) Domingos, nascido aos 18.04.1881 em Leopoldina, que se casou em Belo Horizonte, no dia 06 de setembro de 1913, com Odete Lacerda Tavares, nascida em 02.05.1891 em Leopoldina. Ela era filha de Fernando Pinheiro de Souza Tavares e Maria da Glória Lacerda, sendo descendente dos Lacerda e Werneck, antigas famílias de Leopoldina.

Odete formou-se na Escola Normal do Ginásio Leopoldinense em 1909 e, segundo o Laemmert, era professora da Escola Estadual do distrito de Abaíba em 1911. Foi também professora do Grupo Escolar de Leopoldina que mais tarde recebeu o nome de Ribeiro Junqueira, onde ficou até 1913, quando se mudou para Belo Horizonte. Em 1917 foi nomeada Auxiliar da Diretora do Grupo Escolar Silviano Brandão de Belo Horizonte.

Domingos foi aluno de escola pública do Professor José Maria Tesson, no então distrito de Argirita. Em 1904 lançou uma fábrica de águas minerais em Leopoldina, que pode ser o empreendimento citado por seu neto Fernando Sabino como “fábrica de Soda e de Água de Selters”. Em 1909 mudou-se para Belo Horizonte para dirigir o escritório da Companhia Brasileira de Eletricidade Siemens Schuckerverke. No ano seguinte, trabalhou no Rio de Janeiro retornando em 1911 para a direção do escritório da empresa em Belo Horizonte.

Em 1926 Domingos era representante da Metropolitan-Vickers Electrical Export Company Limited. Segundo Laemmert, em 1930 pertencia ao quadro de servidores da Chimica Industrial Bayer Meister Lucius em Belo Horizonte, MG. Faleceu em São Lourenço, MG, em 1948.

Domingos e Odete foram pais de Luiza (1914-2001), Gerson (1915-1998), Marilia (1916-?), Maria da Conceição (1918-?), Antonio (1919-?), Berenice (1920-1978) e Fernando Tavares Sabino (1923-2004).

2) Vicente Miguel, o segundo filho de Nicola e Ângela Maria, nasceu em 05.06.1883 em Leopoldina. Casou-se no Rio de Janeiro, em 27.06.1914, com Silvia Micaela Bianca Petrola, nascida por volta de 1893, em Leopoldina, filha dos italianos Nicola Petrola e Margherita Cazzolino. Vicente faleceu no Rio de Janeiro em dezembro de 1930.

3) Maria Antonia nasceu em 05.12.1886 em Leopoldina.

4) João Baptista nasceu em 04.08.1887 em Leopoldina onde se casou com Maria das Dores Levasseur, filha de Benjamim Levasseur de Vasconcelos e Filomena Vargas Corrêa. Ela, nascida em 05.07.1889 em Leopoldina onde faleceu em 14.05.1969. Maria das Dores era neta paterna de Antoine Urbain Levasseur e por sua mãe descendia dos povoadores do Feijão Cru, Antonio Rodrigues Gomes e Manoel Antonio de Almeida.

Segundo Freitas, João Baptista e Maria das Dores residiram na Praça Gama Cerqueira onde vivia a família Levasseur que cultivava o gosto pelo piano. Maria das Dores se formou na Escola Normal do Ginásio Leopoldinense em 1909 e foi professora no Grupo Escolar Ribeiro Junqueira.

5) Deolinda nasceu em 12.10.1888 em Leopoldina.

6) Ernane nasceu em 10.04.1891 em Leopoldina.

Como ficou dito no início deste artigo, após o falecimento da primeira esposa, em 1891, Nicola se casou com Rosa Ana Giudice, com quem teve outros sete filhos, também nascidos em Leopoldina. Mas por uma questão de espaço este segundo casamento será abordado na próxima viagem do Trem de História. Até lá!


Fontes Consultadas:

Archivio di Stato di Sala Consilina, Salerno; Arquivo da Diocese de Leopoldina; Igreja de São José, Belo Horizonte; Cartórios de Notas e de Registro Civil do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte, com a colaboração Eliana Sabino, Mariana Estill Sabino e Stanley Savoretti; Cemitério do Bonfim, Belo Horizonte, e Cemitério Nossa Senhora do Carmo, Leopoldina, MG.

Imprensa Periódica: A Imprensa (Rio de Janeiro); A Noite (Rio); Gazeta de Leopoldina; Gazeta de Notícias (Rio); O Arame (Leopoldina); O Jornal (Rio); O Leopoldinense; O Mediador (Leopoldina); O Paiz (Rio) e O Pharol (Juiz de Fora).

BOTELHO, Luiz Rosseau. Dos 8 aos 80. Belo Horizonte: Vega, 1979.

FREITAS, Mário de. Leopoldina do Meu Tempo. Belo Horizonte: Página, 1985.

LAEMMERT, Eduardo e Henrique. Almanak Laemmert. Rio de Janeiro: 1911.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 345 no jornal Leopoldinense de 16 de dezembro de 2017

91 – Savino # Sabino – Savino em Leopoldina

Nicola Carmelo Rosario Savino foi um dos imigrantes italianos pioneiros da fase da Grande Imigração em Leopoldina, tendo chegado ao município antes de 1880. Era natural de Ispani, província de Salerno, região da Campania.

Ele nasceu(1) no dia 03 de outubro de 1852 em Ispani, filho de Domenico Savino e Brigida Petrola. Era neto paterno de Giovanni Battista Savino e Angela Giudice e neto materno de Rosanna Pagano e Nicola Felice Petrola, sendo este filho de Rocco Petrola e Brigida Teula, todos residentes em Ispani na época do nascimento de Nicola.

Domenico Savino e Brigida Petrola se casaram(2) em Ispani no dia 06 de julho de 1843 e tiveram, pelo menos, mais quatro filhos: Giovanni Battista Salvatore Carmelo nascido(3) em 1844, Rosanna Angela Nicolina nascida(4) em 1849, Carmine(5) nascido em 1856 e Rosana Filomena nascida em 1859.

Nicola Savino exerceu a profissão de sapateiro e em Leopoldina tornou-se sócio ou proprietário de alguns empreendimentos. Casou-se a primeira vez com Angela Maria Grazia Appratto, filha de Vincenzo Appratto e Antonia Pagano. Em segundas núpcias com Rosa Ana Giudice, filha dos italianos Rocco Giudice e Angela Savino.

Por entrelaçamentos familiares e negociais, sua história está ligada a alguns outros imigrantes italianos que chegaram ao Brasil em 1877. Um deles, Nicola Pagano, então com 30 anos de idade, que viajou no mesmo vapor em que vieram Giuseppe Tambasco e Domenico Pagano.

Registre-se que este Giuseppe era parente de Antonio, Sebastiano e Giovanni Tambasco, três irmãos que se estabeleceram em Recreio, distrito de Leopoldina na época.

Nicola Pagano, que era irmão de Antonia Pagano mãe de Nicola Savino, casou-se com a cunhada deste último e com ele realizou negócios em Leopoldina. Nicola Pagano foi sócio, também, de seu irmão Giuseppe Biaggio Pagano, na firma Braz Pagano & Irmão.

Noutra empresa que envolve estes imigrantes, denominada N. Petrola & Pagano, não se sabe qual dos Pagano foi sócio de Nicola Petrola, negociante em Bom Jesus do Rio Pardo (6) – atual município de Argirita, antigo distrito de Leopoldina – do final da década de 1870 até 1898.

A filha de Nicola Petrola e Margherita Cazzolino, Silvia Micaela Bianca Petrola, nascida por volta de 1893, casou-se em 27.06.1914 com o filho de Nicola Savino, Vicente Miguel.

Como se vê, não é muito simples rastrear os vínculos entre estes imigrantes. Além dos casamentos deles próprios e de seus filhos. Nos batismos é possível comprovar o compadrio que parece ter surgido também das relações comerciais entre eles.

Veja-se, por exemplo, os entrelaçamentos seguintes: a mãe de Nicola Savino chamava-se Brigida Petrola e não há dúvida de que seja familiar de Nicola Petrola; a sogra de Nicola Savino, Antonia Pagano, era irmã e também sogra de Nicola Pagano. E comadre nas famílias Eboli, Conte, Pagano e Brando.

Outro aspecto que chama a atenção é que, deste grupo de imigrantes alguns viajaram à Itália pelo menos uma vez, aparentemente para realizar negócios. Fato que os distingue de outros que vieram inicialmente com as famílias e com elas voltaram para a Itália e mais tarde resolveram retornar ao Brasil.

Quanto a Nicola Savino, sabe-se ainda que além da profissão de sapateiro (7), auxiliado pelos filhos mantinha um bar bem frequentado, onde a sociedade leopoldinense se reunia.

Sobre este bar, conta o seu neto Fernando Sabino (8):

“Meu avô Nicolau, italiano de nascença, era dono do Salão Recreio, um bar com pitoresco caramanchão na antiga rua 1° de Março, local também conhecido como praça do Ginásio, com uma tabuleta à entrada em que, para não vender fiado, ele se valia da célebre advertência de Dante: Lasciate ogni speranza voi ch’entrate.”(9)

O neto informa, também, que Nicola Savino importava barris de vinho Chianti da Itália e que vendia sorvete. Ao falar de seu pai, Fernando Sabino declara:

“E meu pai, seu Domingos, (antes de casar-se com a suave dona Odette), inspirado mais pelo vinho que pelo sorvete, juntou-se a um farmacêutico de nome João Teixeira e abriu uma fábrica de Soda e de Água de Selters – precursora, portanto, da alka-seltzer. Dos dois feitos muito me orgulho.”

Registre-se, por fim, que nos manifestos de vapores disponíveis no Arquivo Nacional foram encontrados alguns usuários do sobrenome. Entre eles há um Nicolau Sabino que desembarcou (10) do vapor Paulista no porto do Rio de Janeiro no dia 21 de fevereiro de 1872, proveniente de Santos. Mas por falta de outros dados, não se pode afirmar que seja o personagem do qual se falou aqui e se ocupará no próximo artigo, tratando do seu primeiro casamento. Até lá.


Fontes Consultadas:

1 – Archivio di Stato di Salerno, 1852 Atto di nascita nº 23.

2 – Archivio di Stato di Salerno, lv. 3 de matrimonio, 1843 p. 19 termo 3.

3 – Archivio di Stato di Salerno, Atto di nascita nº 33.

4 – Archivio di Stato di Salerno, Atto di nascita nº 7.

5 – Archivio di Stato di Salerno, Atto di nascita 1856 nr 1.

6 – Gazeta de Leopoldina. (Leopoldina, MG) 08.04.1898 ed 52 p.2.

7 – Na transcrição dos registros de nascimento dos filhos feita em outubro de 1893 em Ispani, Nicola declarou-se sapateiro.

8 – SABINO, Fernando. O Grande Mentecapto. 54.ed. Rio de Janeiro: Record, 2002.

9 – Interpretação livre: perca as esperanças de consumo se entrou aqui sem dinheiro.

10 – Jornal do Commercio (Rio de Janeiro) 22.02.1872, edição 53 p.1.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 344 no jornal Leopoldinense de 1 de dezembro de 2017

90 – Savino # Sabino – De Ispani para o Brasil – Parte II

Conforme prometido no artigo anterior, a imigração de Ispani para o Brasil continua para falar um pouco mais sobre alguns imigrantes que vieram para Leopoldina.

Na consulta aos informativos do Centro Internazionale Studi Emigrazione Italiana para o período objeto deste estudo e observou-se que entre 1878 e 1882 a Campania aparecia com o maior número de expatriados, numa avaliação das províncias do sul e das ilhas italianas.

Considerando que as poucas informações de fonte oral obtidas indicam origem rural do grupo de interesse para este trabalho, foram procurados indicadores das atividades econômicas e condições de moradia da região de origem.

Segundo Fondi(1) e Taruffi et all(2), o tipo de habitação rural na Campania era uma espécie de cabana circular de paredes construídas com pedras e tijolos de argila e esterco, cobertas de palha. O telhado era sustentado por pedra calcária. Em geral, as casas eram divididas em dois ambientes: num deles dormia a família inteira e no outro, os porcos e galinhas.  As paredes eram escuras, mal rebocadas e sujas. O chão era de terra batida. Raros móveis e algumas caixas de madeira compunham o ambiente.

Quanto à dieta, Alvim(3) informa que era composta de pão de farinha de cevada ou centeio com verduras ou cebolas cruas. E neste quadro de penúria eles valorizavam, fundamentalmente, a posse da terra, ainda que exercessem profissões pouco especializadas nos núcleos urbanos mais próximos da moradia no campo.

Diante do quadro, não é difícil compreender o fascínio que lhes despertou a hipótese de se tornarem proprietários de uma gleba num país distante onde não faltava alimento, teto e religião. Mesmo aqueles que já se haviam proletarizado nas periferias dos centros urbanos, como operários de fábricas, sonhavam retomar seu modo de vida rural, dentro da estrutura familiar a que estavam habituados.

Os italianos que chegaram ao Brasil entre o final da década de 1870 e o início da seguinte aportaram num país que não tinha políticas de imigração bem delineadas e a introdução podia ser feita por conta do governo federal, dos governos provinciais ou mesmo de particulares.

Em Minas Gerais a administração central não tinha recursos.  Os primeiros tempos foram repletos de problemas de toda ordem.  A maioria não pensava em se fixar aqui, mas em conseguir algum dinheiro e voltar ao seu país. Esta ansiedade se reflete na trajetória de grupos que não paravam em fazenda alguma, sempre em busca de melhores salários.

Por outro lado, aos fazendeiros não interessava arcar com as despesas de transporte dos imigrantes para sua propriedade sem garantir que lá permaneceriam. Donde surgiram procedimentos que visavam cercear a liberdade dos colonos e que, muitas vezes encontrou forte reação entre eles. O mais comum era o imigrante abandonar a fazenda e pegar a estrada sem destino bem definido. Com a ampliação da malha ferroviária pela zona da mata sul, contam-se inúmeros casos de famílias que passavam poucos meses na fazenda e logo estavam de volta à estação, buscando embarque para outro destino.

Segundo Trento(4), Minas Gerais era a terceira área em ordem de importância dentre as atingidas pela emigração peninsular. Entretanto, somente em 1887 o governo mineiro começou a incentivar a imigração. Até 1893, os viajantes tinham que reembolsar 2/3 da passagem.

Trento lembra que a ocupação dos imigrantes que se dirigiram para a Corte e a província fluminense era diferente da ocorrida em Minas Gerais. Segundo ele, para o Rio de Janeiro vieram meridionais, principalmente das províncias de Cosenza, Potenza e Salerno, e, em número menor, de Nápoles, Caserta e Reggio Calábria.

A proximidade de Leopoldina com a província fluminense permite suspeitar que alguns imigrantes destinados ao Rio de Janeiro atravessaram o Paraíba do Sul e se estabeleceram no município que, na época, destacava-se no cenário regional. Seria o caso dos Eboli, Pagano, Savino e Tambasco, cuja entrada no país ainda não está completamente esclarecida.

É de Angelo Trento a afirmação de que a maior parte dos italianos meridionais dedicava-se ao comércio ambulante das mais variadas mercadorias, incluindo itens de vestuário, alimentação e ferramentas. E informa que em 1874 o comércio ambulante aparecia como a principal atividade dos italianos, seguida das função de engraxate, amolador, sapateiro, jardineiro, marceneiro e barbeiro.

A próxima viagem do Trem de História trará um dos italianos do grupo acima citado. Até lá!


Fontes Consultadas:

1 – FONDI, Mario. La Casa Rurale nella Campania. v.23 s.l.: L.S.Olschki, 1964.

2 – TARUFFI, Dino; NOBILI, Leonello de; VILLARI, Pasquale. La questione agraria e l’emigrazione in Calabria. Firenze: G. Barbèra, 1908.

3 – ALVIM, Zuleika. Imigrantes: a vida privada dos pobres do campo. In: SEVCENKO, Nicolau (org.) História da vida privada. v.3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

4 – TRENTO, Angelo. Do outro lado do Atlântico – um século de imigração italiana no Brasil. São Paulo: Nobel, 1988.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 343 no jornal Leopoldinense de 16 de novembro de 2017

74 – Pelo aniversário da Imigração Italiana em Leopoldina

Neste artigo que pretende marcar a comemoração dos 137 anos da Imigração Italiana em Leopoldina e os 107 anos da Colônia Agrícola da Constança, o Trem de História fugirá um pouco da linha sem deixar a composição descarrilar, para contar um pouco da história da sua própria história.

Desde 2010, quando comemoramos festivamente o Centenário da Colônia Agrícola da Constança, criada aos 12 de abril de 1910, a primeira quinzena de abril passou a ser, para nós, a época em que todo ano homenageamos as famílias que deixaram sua terra natal e vieram contribuir para o desenvolvimento da nossa Leopoldina.

Naquele evento nós comemoramos, também, os 130 anos de Imigração Italiana em Leopoldina, considerando que foi no ano de 1880 que se produziram as mais antigas fontes documentando a presença deles em nosso município. Foi nesse ano que começou a se formar o núcleo estrangeiro mais numeroso por aqui, do qual descende grande número dos atuais leopoldinenses.

Quando iniciamos nossas pesquisas, lá se vão mais de vinte anos, o assunto era desconhecido da grande maioria.Muitos se surpreendiam com nossas informações. Pareciam não acreditar no que viam e descobriam sobre seus antepassados. Porque pouco se sabia sobre a Colônia e menos ainda sobre a imigração italiana em Leopoldina.

Aliás, o primeiro trabalho de peso que divulgou a existência de uma colônia de imigrantes em Leopoldina foi produzido como tese de doutoramento por Norma de Góes Monteiro em 1973 e só atingiu o grande público vinte anos depois, em 1994, quando foi publicado em livro.

E como o conhecimento do passado não existe sem pesquisa, foi preciso um longo trabalho de levantamento de dados até que pudéssemos reuni-los inicialmente numa série de artigos publicados em jornal local de 1999 a 2001, ampliados para nova série publicada entre 2006 e 2010 quando então foram compilados num e-book.

Desde então, muitas pessoas nos procuram para pedir informações ou para colaborar com a ampliação do conhecimento sobre o assunto, gerando novas buscas de fontes probatórias e, consequentemente, a descoberta de novos dados. Assim é que, hoje, a lista de sobrenomes estrangeiros em Leopoldina é consideravelmente maior do que a divulgada há sete anos. E poderá aumentar se novas buscas forem realizadas.

Mas agora queremos reiterar informações já conhecidas, de modo a homenagear todos os imigrantes através de representantes daqueles primeiros tempos.

Conforme dissemos acima, as mais antigas referências à presença de italianos em Leopoldina são de 1880. Uma delas é o casamento de Nicola Pagano com Maria Giovanna Appratti. No ano anterior, no então distrito de Recreio, haviam se casado Giovanni Tambasco e Maria Amélia Guimarães, sendo ele irmão de Sebastiano Tambasco que morava em Leopoldina. Através de relações de compadrio ou comerciais destes personagens, sabemos que aqui também já viviam Filomena Brando, Francesco Conte, Nicola Eboli, Francesco e Giuseppe Biaggio Pagano, Nicola Sabino, e, provavelmente, o casal Vincenzo Appratti e Antonia Pagano.

Sem contar com outros estrangeiros que já viviam por aqui, mas cujos dados não conseguimos apurar, a década de 1880 veio ampliar consideravelmente a presença de italianos, assim como a chegada de portugueses continentais e das ilhas atlânticas, além de espanhóis. De tal sorte que em todos os distritos são encontradas referências a imigrantes trabalhando em fazendas ou em profissões autônomas nos povoados. Até que, na última década daquele século, organizou-se uma colônia municipal onde muitos deles se estabeleceram.

E em 1910, com a criação da Colônia Agrícola da Constança, em terras que fizeram parte das antigas fazendas Boa Sorte, Constança e Dona Antonia, foram demarcados lotes a serem vendidos aos imigrantes. A organização do núcleo colonial fora iniciada no ano anterior, quando os primeiros 10 lotes foram ocupados. O total de unidades ultrapassou 60 lotes, cada um deles com uma casa de morada e, tendo em média 5 alqueires de terra. Estes lotes eram financiados com o pagamento através de prestações anuais representativas de 20% da arrecadação da colheita agrícola de cada colono proprietário. A partir da aquisição do lote, com muito trabalho de parte de todos da família, aos poucos os colonos foram adquirindo carros de bois, carroças, arados, grade rústica puxada por animais e outros implementos, com o auxílio da administração da Colônia o que melhorava a produção e a qualidade de vida da família.

Vale registrar que o Estado administrou esta Colônia fornecendo máquinas, equipamentos e sementes até sua emancipação em 1921. Mas os imigrantes italianos da Colônia Agrícola da Constança, e os do comércio e atividades em geral, continuaram na luta diária, produzindo e contribuindo para o desenvolvimento dos seus e da cidade de Leopoldina. Fazendo-se  respeitados  e merecedores dos aplausos de todos.

O Trem de História de hoje fica por aqui. Chegou a hora de preparar a carga para a próxima viagem que virá para as comemorações do aniversário da cidade. Até lá.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 329 no jornal Leopoldinense de 16 de abril  de 2017

Centenário de Nascimento

Nascimentos em Leopoldina

01 jan 1917

Antonio

Pai: Francisco Benedito do Nascimento

Mãe: Rosa Corradin


07 jan 1917

Ozieta

Pai: João Ventura Gonçalves Neto

Mãe: Alcina Paula Moraes


08 jan 1917

Ana

Pai: João Ferreira de Oliveira

Mãe: Maria Lazarina Duana

Dorotea Zamboni

Pai: Francesco Zamboni

Mãe: Orsola Pagano


11 jan 1917

Eunice Maciello

Pai: Angelo Maciello

Mãe: Sarah de Oliveira Rocha

Maria de Lourdes

Pai: José Augusto Monteiro da Silva Filho

Mãe: Maria da Glória de Aguiar


18 jan 1917

Rosa Maria Sangalli

Pai: Arturo Sangalli

Mãe: Maria Stella Borella

Sebastiana

Pai: Pedro Pacheco de Carvalho filho

Mãe: Manoela Rodrigues de Moraes


24 jan 1917

Francisco Gigli

Pai: Celso Gigli

Mãe: Ida Fontanella


26 jan 1917

Maria de Lourdes Pedroni

Pai: Angelo Pedroni

Mãe: Maria Pedroso de Oliveira


27 jan 1917

Eliza Bartoli

Pai: Alberto Bartoli

Mãe: Natalina Sardi


29 jan 1917

Lauro

Pai: Joaquim Martins de Almeida filho

Mãe: Maria Julia Silva

Rosa Bartoli

Pai: Alfredo Bartoli

Mãe: Virginia Rosa Carraro


30 jan 1917

Nizia Lacerda

Pai: Custódio Lacerda Filho

Mãe: Etelvina Rodrigues Ferreira

Há 100 anos

Leopoldinenses nascidos em novembro de 1914

Luzia                                1 nov 1914                filha de Abilio Moroni e de Ema Metilde Lupatini

Maria Santina                    1 nov 1914                filha de Egidio Sangirolami e de Pierina Mariana Borella

Joaquim                           5 nov 1914                filho de Joaquim Gama de Castro Lacerda e de Maria da Conceição Monteiro de Barros

Silvio Bedin                      6 nov 1914                filho de Gioacchino Bedin e de Angelina Sardi

Maria                                7 nov 1914                filha de João Evangelista F Neto e de Francisca Ramos de Melo

Marilia                              9 nov 1914                filha de Belizario Augusto Soares de Souza Filho e de Abigail Botelho Reis

Lourival Vieira d Oliveira    9 nov 1914                filho de Francisco Vieira de Oliveira e de Maria de Assis Pereira

Antonio                            14 nov 1914              filho de Galdino Cipriano de Carvalho e de Maria Silvana Soares

Caetano Zamboni             15 nov 1914              filho de Domenico Zamboni e de Assunta Campana

Gumercindo                      18 nov 1914              filho de Virgilio Garcia de Matos e de Virgilina Machado

Tereza                              21 nov 1914              filha de Francesco Zamboni e de Ursula Pagano

Vanor                               22 nov 1914              filho de Joaquim Martins de Almeida e de Laura Francisca Oliveira

Francisca                         25 nov 1914              filha de Jorge Elmaes e de Rosaria Maiello

Angelina                           27 nov 1914              filha de Paolo Samorè e de Carolina Honória de Jesus

Francisco                         27 nov 1914              filho de Custodio de Vargas Coimbra e de Maria das Dores Fontes

Uma diferença entre os imigrantes em Leopoldina

Mandamos para o lado de lá dos mares a única mercadoria de que temos abundância: o homem.

Esta declaração do político italiano Giustino Fortunato, num discurso incluído na série de 1880 a 1910 publicada sob o título Il Mezzogiorno e lo Stato Italiano, nos faz pensar na união de dois interesses: a Italia entendia ser necessário exportar uma parte de seus habitantes e o Brasil buscava soluções para acabar com a escravidão.

Visto por este prisma, a chegada do imigrante italiano em nossas fazendas afasta qualquer tentativa de romancear o assunto. Entretanto, parece que os colonos transmitiram a seus descendentes uma outra visão, talvez por desconhecerem o que se passava na esfera do poder. Por outro lado, há que se considerar os não colonos, ou seja, os que se estabeleceram desde o início na área urbana e que talvez tenham contribuído para o nascimento das memórias familiares que tratam de fugas do alistamento militar e embarques ilegais. De modo geral, estas versões se referem aos italianos no mezzogiorno.

Segundo Gramsci em O Sul e a Guerra, o processo de unificação da Italia, realizado para atender aos interesses do capital, resultou na transferência “de todo dinheiro líquido do Sul para o Norte”. Este aspecto da chamada “Questione Meridionale” parece ter sido uma das alavancas para a emigração no período imediatamente posterior à década de 1860.

Gramsci declara ser injusta a acusação de falta de iniciativa da população meridional como causa do baixo desenvolvimento da região. Para ele, o capital procura instalar-se onde são mais rentáveis os investimentos e o poder central não ofereceu condições de desenvolvimento industrial no sul. Para outros estudiosos da Questão Meridional, o carreamento de capital para o norte não deixou outra alternativa além do abandono da pátria, ainda que inicialmente pensada individualmente como temporária.

O estudo da trajetória dos que chegaram a Leopoldina antes do período denominado Grande Imigranção é dificultado pela falta de registros mais detalhados nas fontes que foram preservadas. Na pequena amosta que pudemos reunir, observamos que os chegados antes de 1888 nasceram na Campania (Pagano), Basilicata (Brando) ou Calabria, eram imigrantes com recursos próprios e viajaram sem subvenção. Portanto, não vieram estimulados pelos projetos de colonização agrícola. Entre eles estão os casos de viagens temporárias à Itália depois de aqui estabelecidos. E aqui cabe uma distinção importante.

Entre os imigrantes cuja primeira vinda ao Brasil ocorreu na última década do século XIX, indentificamos alguns casos de viagem de volta, ou seja, objetivando o retorno definitivo (Lupatini e Moroni). Mesmo que mais tarde uns poucos tenham voltado para o Brasil, classificamos como retorno definitivo as situações em que a família buscou embarque subvencionado e não deixou bens ou vínculos outros em Leopoldina. Até o momento, nesta classificação estão apenas italianos do norte.

Salerno, província das mais citadas.


Entre as províncias da Campania, Salerno é a de maior incidência em Leopoldina.

Até aqui pudemos confirmar a origem na Campania das famílias

Andrea, Apprata, Brando, Caiafa, Cobucci, Eboli, Fermadi, Finamori, Gripp, Manza, Mauro, Mazzei, Pagano, Prete, Russo, Scaramucci e Sparanno.

Entre elas encontram-se os imigrantes com registro mais remoto na cidade, sendo citados já no ano de 1880.

Tambasco

on Wednesday, June 24, 2009 at 3:54:41 pm
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nome: Emilia Macedo

cidade: São Paulo

estado: SP

observacoes: quem foi o primeiro italiano que chegou na cidade? Estou procurando Antonio Tamboschi, um italiano que morou em Minas. Uma filha dele nasceu em Leopoldina em 1871. quero saber onde ele nasceu.

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Não temos o sobrenome de seu interesse. Entretanto, sabemos que Antonio Tambasco e seu irmão Giovanni já estavam em Leopoldina no ano de 1879.

Os mais antigos registros encontrados em Leopoldina, citando origem na Itália, são posteriores à data que você indica. Não podemos, ainda, informar qual foi o primeiro imigrante italiano a chegar na cidade. Por enquanto sabemos que Giovanni Tambasco casou-se no dia 10 de maio de 1879 e Nicola Pagano casou-se em novembro do ano seguinte.