171 – O registro de terras e os vizinhos de Antonio e Bento Rodrigues Gomes

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Quando o Trem de História iniciou a série sobre os Pioneiros de Leopoldina surgiram indagações sobre como foram feitas as primeiras concessões de terras a particulares em Leopoldina. Assim, a viagem de hoje começa contando como isto se deu.

O ponto de partida é ter em mente que não houve concessão de sesmarias após a Independência, em 1822. E que dali em diante, até 1850, esteve em discussão o ordenamento jurídico sobre a propriedade da terra no país. Finalmente, em 1850 foi aprovada a chamada Lei de Terras[1] e a 30 de janeiro de 1854 o governo baixou o Decreto nº 1318 que regulamentou a mencionada Lei e criou os mecanismos para sua execução.

Entre estes mecanismos estava a obrigatoriedade dos proprietários de terras particulares levá-las a registro. Este registro se fazia através de declarações de área, localização e confrontações da propriedade, informadas ao Padre que fazia, então, o Registro de Terras em livro próprio. Uma declaração baseada unicamente em medidas muitas vezes acrescidas da expressão “pouco mais ou menos” e poucas referências além da indicação de um curso d’água, cachoeira ou montanha; e confrontações tão imprecisas que às vezes o declarante “A” omitia “B” que em registro mais adiante declarava “A” como vizinho. 

No caso de Leopoldina, este procedimento de registro foi realizado entre 21 de fevereiro e 20 de abril de 1856 e o documento gerado se encontra no Arquivo Público Mineiro[2]. Trata-se de um caderno com 23 folhas utilizadas em frente e verso, nas quais foram feitos 95 lançamentos, sendo que em alguns deles há mais de uma propriedade descrita e há caso de propriedade com vários sócios, onde todos são mencionados num só registro.

Ressalte-se, ainda, que o registro era feito por Freguesia. Assim, lembrando que a Vila Leopoldina era um imenso território que abrangia outras freguesias, como Santa Rita do Meia Pataca e Bom Jesus do Rio Pardo, por exemplo, é fácil imaginar que é necessário consultar mais de um daqueles livros para abranger todos os proprietários que aqui viviam. Sem contar que diversos proprietários fizeram o registro em freguesias então vizinhas, como Santo Antônio de Pádua, o que foi o caso de residentes no então extenso distrito de Conceição da Boa Vista.

Outro fato a destacar é que após o registro da propriedade era necessário demarcá-la, atitude que nem sempre foi tomada de imediato, por razões as mais diversas.

Segundo Lígia Osório Silva[3], para iniciar o processo de medição era preciso fazer um requerimento ao Juiz Comissário, figura que não pertencia aos quadros da Magistratura. Entretanto, parece que no interior o papel era exercido pelo Juiz de Direito e Juiz Municipal, conforme se observa nos processos de Leopoldina analisados pelos autores desta série. O Juiz nomeava, com aprovação dos interessados, os profissionais que realizariam o trabalho, como o agrimensor e os “louvados” que eram as duas testemunhas de todo o processo.

Conforme ficou dito anteriormente, na época da chegada dos pioneiros os cursos d´água eram os principais marcadores para localização das propriedades. Mas é bom lembrar que nem todos cursos conservam hoje a denominação usual do início da história do lugar. No esquema adiante, por exemplo, é o caso do Córrego das Palmeiras que já se chamou João Ides e, do Córrego das Virgens, cujo primeiro nome foi Recreio, conforme consta em registros e processos de divisão das propriedades. Há, também, a hipótese de que o atual Ribeirão Jacareacanga tenha sido inicialmente denominado Córrego do Bagre, em referência à propriedade que Bento Rodrigues Gomes formou na barra do córrego deste nome.

Com base nas fontes citadas, os autores desta série montaram o esquema[4] abaixo para facilitar a localização das antigas fazendas na área que se estende a nordeste do centro urbano de Leopoldina em direção ao distrito de Ribeiro Junqueira. Nele as iniciais indicam: AV = Águas Vertentes; B = Boa Vista dos Barbosas; BL= Barra das Laranjeiras; CB = Cachoeira do Bagre; F = Fortaleza; Rc = Recreio; Rs = Residência; S = Santana dos Miranda; SC = Santa Cruz.

A fazenda Águas Vertentes, de Antonio Rodrigues Gomes, fazia divisa com as propriedades de seu irmão Bento Rodrigues Gomes e também com Antonio Carlos Teles Faião, Antonio Joaquim Teixeira, João Gualberto Ferreira Brito, José Thomaz de Aquino Cabral e Mariana Pereira Duarte.

O Trem de História pretende trazer algumas informações sobre estes confrontantes e esclarecer casos como o de Antonio Carlos da Silva Teles Faião[5] que não indicou o nome de sua propriedade. Mas isto vai ficar para a próxima viagem, porque a carga de hoje está completa. Até lá.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 423 no jornal Leopoldinense, agosto de 2021


Fontes consultadas: 
[1] Lei nº 601 de 18 de setembro de 1850 
[2] Registro de Terras de Leopoldina, Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114, nº 11 
[3] SILVA, Lígia Osorio. Terras devolutas e latifúndio: efeitos da Lei de 1850. Campinas, SP: Editora da Unicampo, 1996. p.168 
[4] Decalque de recorte da Carta do Brasil 1:50 000 - 1977 - Folhas SF-23-X-D-II-4 Cataguases e SF-23-X-D-V-2 Leopoldina - Instituto de Geociências Aplicadas de Minas Gerais - Diretoria de Geodésia e Cartografia 
[5] Registro de Terras de Leopoldina, Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114, nº 8.

Resultado de uma Eleição em 1852

 

Em setembro de 1852 foi realizada, em Piacatuba, uma Assembleia Paroquial para eleger sete vereadores para formar a Câmara Municipal de Mar de Espanha, e quatro juízes de paz para o Distrito do Feijão Cru.

Livro 1 de Atas de Assembleias Eleitorais de Piacatuba

Resultado apurado para vereador:

Nomes: Votos
Francisco Correa Pinto 93
Joaquim Vidal Leite Ribeiro 79
Domiciano Mateus Monteiro de Castro 70
José Joaquim Ferreira Monteiro de Barros 69
Joaquim Antonio de Almeida e Gama 67
Domingos Eugenio Pereira 62
Domingos da Costa Matos 51
Emidio José de Barros 41
Antônio José de Carvalho 39
Custódio Ferreira Leite 27
José Dutra Nicacio 22
José Garcia de Matos 20
Domiciano Alves Garcia 17
Francisco Soares Valente 16
José Augusto Monteiro de Barros 08
Francisco de Paula Galdino Leite 08
Francisco Teixeira Alves 03
Manoel José Pires 02
João Pereira da Silva 02
João Gualberto Ferreira Brito 02
Antonio José Monteiro de Barros 02
José Antonio de Matos 01
José Eugênio Teixeira Leite 01
Antonio Avelino Teixeira Alves 01
Manoel José Monteiro de Barros Galvão de São Martinho 01
José Soares Valente 01
Joaquim Cláudio Nogueira 01
Claudino Vieira da Silva 01

Resultado para Juiz de Paz:

Nome: Votos
Claudino Vieira da Silva 77
Custódio Dias Moreira * 71
Antônio Pereira da Silva * 71
Joze Henriques da Mata 68
Manoel de Sá Rocha 21
Luiz Pereira da Silva 20
João Patricio de Moura e Silva 20
Francisco Henriques Júnior 18
Teodoro Antunes da Costa 15
Ezequiel Henriques Brandão 06
João Batista Mendes 06
Vital Antonio de Mendonça 05
José Fajardo de Melo 02
Domingos Henriques de São Nicácio 02
Hipólito Pereira da Silva 01
Manoel Henriques 01

 

Instalação da Vila Leopoldina

RECONTOS DE UM RECANTO

Voltamos às páginas da Gazeta para contar um pouco mais sobre a história de Leopoldina.

E, nesta edição comemorativa, começamos pela transcrição do Auto da Instalação da Vila, do primeiro livro de atas.

~ Auto da installação da Villa Leopoldina ~

Aos vinte dias do mez de Janeiro do Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e cincoenta e cinco, trigesimo quarto da Independencia e do Imperio, na sala destinada para as Sessões da Camara Municipal da Villa Leopoldina, creada pela Lei Provincial numero seiscentos e sessenta e seis, de vinte e sete de Abril do anno proximo passado, achando-se o Doutor Domiciano Matheus Monteiro de Castro, vereador, servindo de Presidente da Camara Municipal da Villa do Mar d’Hespanha, comigo Secretario da mesma Camara, e reunidos os vereadores eleitos, o Capitão Manoel José Monteiro de Castro, Doutor José Joaquim Ferreira Monteiro de Barros, Francisco José de Freitas Lima, Major João Vidal Leite Ribeiro , Capitão João Gualberto Ferreira Britto, e José Vieira de Resende e Silva, o mesmo Presidente, em cumprimento do Decreto de treze de Novembro de mil oitocentos e trinta e dous, e da Portaria do Excellentissimo Presidente da Provincia de vinte e cinco de Novembro de mil oitocentos e cincoenta e quatro, deferio-lhes juramento, e deo posse, não tendo comparecido o Vereador eleito Custodio Teixeira Leite, ficando assim installada a referida Villa Leopoldina. Para constar mandou o mesmo Presidente lavrar este Auto, em que se assigna com os mencionados Vereadores empossados. Eu José de Souza Lima, Secretario, o escrevi.

Assinaturas no Auto de Instalação da Vila Leopoldina

Identificação das assinaturas:

Domiciano Matheus Monteiro de Castro (Câmara de Mar de Espanha);

Manoel José Monteiro de Castro;

Joze Joaquim Ferreira Monteiro de Barros;

Francisco José de Freitas Lima;

José Vieira de Resende e Silva; e,

João Gualberto Ferreira Brito

Naquele 20 de janeiro de 1855 começava nossa independência administrativa. Mais de 50 anos depois que os primeiros homens livres escolheram as margens do Feijão Cru para viver.

Vale registrar que se os primeiros aventureiros cruzaram a mata virgem por volta de 1780, foi no alvorecer do século dezenove que a administração pública passou a localizá-los em documentos, concedendo-lhes terras, as sesmarias, nos então chamados “sertões do leste”. E a não mais de quarenta homens teria sido permitida a fixação de residência no caminho trilhado por Pedro Afonso Galvão de São Martinho quando da primeira diligência, em 1784, por estas matas até então proibidas.

Somente a partir das cartas concedidas em 1811 encontramos os “fregueses” do futuro Curato do Feijão Crú. Deste momento em diante é que passamos a observar a presença de famílias que deixaram descendentes dentro dos limites do que veio a constituir, quase vinte anos depois, o distrito do Feijão Cru, da então Vila de São Manoel do Pomba.

Conta-nos Sinval Santiago, em “Município do Pomba – Síntese Histórica”, que os distritos do Feijão Crú e da Santíssima Trindade do Descoberto foram os primeiros criados pela Câmara Municipal do Pomba, com base no Decreto Imperial de 11.09.1830. Infelizmente os incêndios freqüentemente citados nos livros de história também constituem justificativa para o desaparecimento dos documentos que esclareceriam melhor a gênese de Leopoldina.

Sabemos que em 1828 os principais moradores do Feijão Cru foram testemunhas da doação do patrimônio da futura capela de Santa Rita do Meia Pataca, o que nos confirma já existir por aqui algum tipo de organização social para “enviar” representantes para participar de um ato de tal importância.

Isto nos leva a colocar em dúvida o ano de 1831 como sendo o do nascimento do nosso povoado. Ainda mais se considerarmos que encontramos os pioneiros do Feijão Cru em registros paroquiais nos seus povoados de origem, basicamente as capelas da Serra da Ibitipoca, somente até bem antes da data que historiadores antigos consideram como de nossa fundação. E mais dúvidas se podem acrescentar quando encontramos filhos dos primeiros moradores que, ao se casarem, declararam terem nascido no nosso Feijão Cru.

Mas a incúria de alguns detentores de cargos públicos do passado obriga-nos a repetir a palavra “infelizmente”. Porque o descaso deles permitiu que desaparacessem  livros paroquiais que nos contariam a história completa deste recanto da Mata.

Verdade é que, documentado em nosso território desde o início do século dezenove, o homem livre conseguira, finalmente, em 1854, realizar o sonho de organizar-se em uma sociedade. Nascia, então, no território da Vila de São Manoel do Pomba, à qual pertenceu até 10 de setembro de 1851, o Feijão Cru, pela Lei 666 de 27 de abril de 1854.     E a 20 de janeiro de 1855, antes de completados nove meses da promulgação da Lei, o presidente da câmara municipal da Vila de Mar de Espanha deu posse aos nossos primeiros representantes, presididos pelo senhor Manoel José Monteiro de Castro, o mais velho dentre os eleitos para a Câmara de Leopoldina, sendo coadjuvado na administração pelos senhores Francisco José de Freitas Lima, João Gualberto Ferreira Brito, José Joaquim Ferreira Monteiro de Barros e José Vieira de Resende e Silva.

josé luiz machado rodrigues

nilza cantoni