184 – Fazenda Boa Vista dos Barbosas

Denominada inicialmente Fazenda Boa Vista, a pesquisa sobre esta propriedade apresentou dificuldades a partir do próprio nome. Enquanto nos registros de terras de 1856 constam três propriedades com o mesmo nome no território da então Vila Leopoldina, nos processos de divisão de propriedades e partilha de bens inventariados, entre 1847 e 1901 foram encontradas treze fazendas Boa Vista, muitas delas sem localização precisa.

Para distingui-las foi fundamental o conjunto de dados coletados pelos autores desta coluna ao longo das pesquisas sobre a história de Leopoldina. Pois conforme ensina a antropologia, a família ou parentesco constituem o elemento fundador da vida social. E só conhecendo minimamente os grupos sociais que habitam uma localidade é possível compreender suas escolhas e decisões. Foi importante, também, lembrar Ruth Cardoso ao discutir armadilhas da pesquisa em antropologia, quando destacou que coletar material não é apenas acumular informações, mas oportunidade para reformular hipóteses de pesquisa. Isto aconteceu, diversas vezes, na pesquisa sobre a ocupação territorial do Feijão Cru e, especialmente, com a Fazenda Boa Vista dos Barbosas.

Ao prestar informações sobre sua propriedade, Francisco da Silva Barbosa declarou que vinte e cinco anos antes (por volta de 1831) havia comprado 250 alqueires de terras, sem indicar o vendedor. Mencionou confrontações com José Thomaz de Aguiar Cabral (fazenda Santa Cruz), Marianna Teresa Pereira Duarte (faz. Recreio), Processo José Corrêa de Lacerda (faz. Tabuleiro), Manoel Jose de Novaes (faz. Saudades, depois Campo Limpo), Manoel Ferreira Brito (faz. São Manoel da Bocaina) e João Baptista de Paula Almeida (faz. Monte Alegre). Outros proprietários citaram divisas com a faz. Boa Vista, com Antonio Carlos da Silva Teles Faião (faz. da Barra das Laranjeiras), além de Joaquim José da Costa Cruz e Joaquim Dias Neto com propriedades à margem do Rio Pomba.

Francisco da Silva Barbosa faleceu no dia 20.09.1860 e seu inventário, em conjunto com o processo de partilha e posteriores tombamentos em 1884 e 1885 trouxeram esclarecimentos importantes. A constituição do grupo familiar foi possível pela análise comparativa do inventário e da partilha de bens, já que alguns membros não foram identificados num ou noutro documento, por terem falecido ou por terem transferido sua legítima para terceiros. Como já mencionado nesta série, a instituição do dote permanecia até o final do século XIX e, muitas vezes, só depois do inventário dos pais é que os bens prometidos aos filhos eram oficialmente transferidos para eles. Por isto, nem sempre todos os filhos vivos eram mencionados no formal de partilha.

No caso da Fazenda Boa Vista, o processo de divisão judicial da propriedade foi requerido por João Gualberto Damasceno Ferreira em duas etapas, sendo a primeira em 06.10.1884 e a segunda, em 06.08.1885, indicou que após a morte de Francisco da Silva Barbosa a propriedade pertencia a oito condôminos:

  • 1) Antonio Francisco Barbosa Neto, filho de Francisco da Silva Barbosa;
  • 2) Domiciano Rodrigues Leite, neto, filho de Ana Francisca;
  • 3) Elias Carlos da Paixão, marido da neta Carolina, filha de Ana Francisca;
  • 4) Francisco da Costa Muniz, marido da neta Vicencia, filha de Ana Francisca;
  • 5) Joaquim Luiz de Santana ou Medeiros, genro, marido de Maria do Rosário Neto;
  • 6) José Francisco Neto, filho;
  • 7) Rita Francisca da Silva, filha; e,
  • 8) Severino José de Santana, genro, marido de Joaquina Francisca de Jesus.

Nos vinte anos seguintes à morte do formador da fazenda, ocorreram muitas subdivisões e vendas. Ao final do processo de medição, em 1885, foram encontrados 72 condôminos e entre eles estão alguns imigrantes que a memória popular informa terem vivido na “Colônia da Serra dos Netos”. Na conferência das operações de compra e venda, o total de condôminos foi ampliado para 81 por dois motivos principais: herança ou compra e venda.

Após a morte do pioneiro, em 1860, a propriedade passou a ser conhecida como fazenda “dos Barbosa” e as escrituras de compra e venda demonstram que nela foram formadas diversas “situações” que, em linguagem atual, significa vários pequenos sítios numa fazenda indivisa.

No alvorecer do século XX a região da Fazenda Boa Vista passou a ser conhecida por Serra dos Netos, numa referência ao sobrenome da família da esposa de Francisco da Silva Barbosa, de descendentes dele ou do formador da fazenda Residência, também de sobrenome Gonçalves Neto.

O requerente da divisão judicial, João Gualberto Damasceno Ferreira, era filho do pioneiro João Gualberto Ferreira Brito de quem herdou a fazenda Fortaleza também próxima da Boa Vista e que foi ampliando seus domínios através de compras diretas ou de Arrematação em Praça dos bens de seus vizinhos, em especial de terras das fazendas Desengano e Boa Vista.

Uma das “situações” adquiridas por João Gualberto Damasceno Ferreira pertencia a João José Rodrigues das Virgens que chegou ao Feijão Cru por volta de 1864 e provavelmente foi um dos primeiros adquirentes de pedaços da Fazenda Boa Vista que teriam sido vendidos depois da morte de Francisco da Silva Barbosa. O comprador instalou a sede de sua propriedade no então sítio das Virgens, referência ao nome de devoção usado como sobrenome pelo antigo proprietário, falecido em 1881. Esta é, pois, a origem do topônimo Serra das Virgens para o qual a imaginação popular inventou mais uma das lendas mirabolantes que povoam a história pátria.

João José Rodrigues das Virgens, casado com Francisca Maria de Paula, teve três filhos:

  • 1) Ezequiel, nascido em 1867;
  • 2) Custódia Maria de Jesus, casada aos 07.01.1893 com Joaquim Honório de Almeida, filho de Francisco Honório de Oliveira e Maria Izabel de São José; e,
  • 3) Vitalina Maria das Virgens, nascida a 08.07.1880, casou-se no dia 14.10.1906 com José Galdino Eugenio, natural de Cataguases.

Aqui o Trem de História faz uma parada. No próximo Jornal a viagem segue com a família do pioneiro Francisco da Silva Barbosa. Até lá.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 436 no jornal Leopoldinense, setembro de 2022

Fontes Consultadas: 
Arquivo da Diocese de Leopoldina, lv 01 bat fls 198 termo 954; lv 02 bat fls 29 termo 264; lv 2 cas fls 79 termo 3 e lv 3 cas fls 346 termo 77. 
Divisão judicial da fazenda dos Barbosa, parte 1, Processo 38404284, 1884 COARPE/TJMG 
Inventário de Francisco da Silva Barbosa, processo 38403431 COARPE - TJMG 
Partilha amigável do espólio requerida por Ana Josefa da Silva, processo 38402712 COARPE/TJMG 
CARDOSO, Ruth C. L. (org.) Aventuras de Antropólogos em campo ou como escapar das armadilhas do método. In: A aventura antropológica. Teoria e pesquisa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. p.101

175 – Fazenda Campo Limpo de Manoel José de Novaes

Logomarca Trem de História

Hoje o Trem de História traz, em seu vagão principal, a propriedade da família Novaes que fazia divisa com a Fazenda Recreio abordada na última edição. E assim como o nome da propriedade de Antonio José Dutra e Mariana Teresa Pereira Duarte faz algumas pessoas pensarem no vizinho município de Recreio, também a Fazenda Campo Limpo já causou engano em alguns estudiosos.

Portanto, necessário se faz esclarecer que houve, pelo menos, duas fazendas com o nome Campo Limpo no território de Leopoldina. Uma delas é a citada pelo Cônego Raimundo Trindade e que pertenceu a Felisberto da Silva Gonçalves. Felisberto era sobrinho do alferes Tiradentes. Ele e a esposa receberam duas sesmarias no córrego do Glória em 1813. Esta sua fazenda Campo Limpo ficava localizada entre as fozes dos atuais ribeirões São Bento e Campo Alegre no Rio Pardo e o filho de Felisberto, Antonio Felisberto da Silva Gonçalves, nela residia em 1867.

A outra fazenda Campo Limpo, cuja história hoje se conta, teve sua origem no Sítio Saudades, pertencente a Manoel José de Novaes e sua esposa Ana Francisca Garcia. Propriedade que em 1874 já recebia o nome de Fazenda Campo Limpo e permanecia com os mesmos 300 alqueires citados no Registro em 1856.

O casal formador dessa Campo Limpo chegou ao Feijão Cru entre 1831 e 1835, com seis filhos. Estabeleceram-se às margens do Rio Pomba onde foram vizinhos de Mariana Pereira Duarte [fazenda Recreio], Francisco da Silva Barbosa [Fazenda Boa Vista], Processo José Corrêa de Lacerda [Fazenda Tabuleiro], Pedro Baldoino da Silva [Fazenda Boa Sorte], Pedro de Oliveira e Silva [Fazenda Pedro Velho], além de Pedro Moreira de Souza e Francisco Martins de Andrade cujas propriedades não foram registradas pelo pároco do Feijão Cru.

A propriedade de Pedro Moreira era a legítima paterna de sua esposa, Gertrudes Balbina de São José, que era irmã de Francisca de Paula Reis, esposa de Pedro Baldoino da Silva. Gertrudes e Francisca eram filhas de Maria Felicia dos Reis e José Ignacio de Souza que era natural do Quilombo, atual Bias Fortes, filho de José Mendes de Souza e Ursula Maria. Lá se casou, em 1809, com Maria Felicia dos Reis, nascida em 1792 em Santa Rita de Ibitipoca. Era filha de Miguel Esteves dos Reis e Clara Teodora de Castro. José Ignacio faleceu em Leopoldina em julho de 1844.

José Ignacio e Maria Felicia foram pais de: 01 – Maria Carolina de Jesus cc José Casemiro da Costa e em 1856 vizinhos da fazenda Pedro Velho; 02 – José Simpliciano dos Reis, que em 1856 foi citado como vizinho da fazenda Tabuleiro, era casado com Mariana Constança de Assunção; 03 – Gertrudes Balbina de São José nascida em 1816 no Quilombo, cc Pedro Moreira de Souza; 04 – Candida Ozoria de Rezende se casou com Antonio Garcia de Novaes, filho do formador da fazenda Saudades ou Campo Limpo; 05 – Francisca de Paula Reis cc Pedro Baldoíno da Silva que registrou a fazenda Boa Sorte em 1856; 06 – Cesario José dos Reis, nascido por volta de 1823; e, 07 – Julia nascida por volta de 1838.

Segundo seu inventário, José Ignacio de Souza formou a fazenda Bocaina, provavelmente em terras adquiridas de Manoel Ferreira Brito que teria sido o fundador da Fazenda São Manoel da Bocaina.

Sobre o casal formador da Fazenda Saudade ou Campo Limpo, registre-se que a matriarca Ana Francisca Garcia nasceu em Aiuruoca, filha de José Garcia e Maria do Rosário. Casou-se com Manoel José de Novaes a 22.06.1808, em Bom Jardim de Minas onde ele nasceu, filho de Domingos José de Novaes e Genoveva Maria do Rosário.

Vale observar que pela proximidade de origem com os Ferreira Brito e os Almeida Ramos, é possível que o casal tenha migrado para o Feijão Cru a convite deles.

Ana Francisca faleceu no dia 28.06.1852 e em seu inventário consta uma informação esclarecedora. Segundo declaração do agrimensor, a propriedade da família estendia-se da margem do Rio Pomba até as terras da Bocaina. Indicando, portanto, que a área urbana no arraial depois distrito de Campo Limpo surgiu na confrontação entre as duas fazendas.

Manoel José faleceu no dia em 05.09.1872 e o inventário foi aberto em maio de 1874. Naquele momento, seus bens já se encontravam sob administração dos herdeiros, incluindo seu vizinho e genro, Processo Lacerda.

Manoel José de Novaes e Ana Francisca Garcia foram pais de: 01 – João Batista, nascido por volta de 1817 e falecido em Campo Limpo em 1873, incapaz, foi representado por curador no inventário do pai; 02 – Maria Vitoria, cc Processo José Corrêa de Lacerda de quem se falará na próxima edição; 03 – Sebastião José cc Francisca Maria de Jesus; 04 – Antonio Garcia de Novaes cc Candida Maria de Rezende, filha de José Ignacio de Souza, da fazenda Bocaina; 05 – Francisco José, nascido por volta de 1830 e falecido solteiro logo depois da morte da mãe; e, 06 – Pedro José cc Candida Pompilia Tavares, casal que viveu no distrito de Tebas.

Chegado à estação, o Trem de História irá preparar a carga de outra propriedade que esteve profundamente ligada a Campo Limpo.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 427 no jornal Leopoldinense, dezembro de 2021

Fontes Consultadas: 
Arquivo Público Mineiro PP 1/10 CX 01 DOC 04, Termo de São João Del Rei, Mapa da População de Bom Jardim - 1831, quarteirão 2, fogo 2 e CX 03 DOC 06, Termo da Vila da Pomba, Mapa da População do Feijão Cru, 1835 fls 21 fam 82; Carta de Sesmaria. SC 352 fls 76 e Coleção Casa dos Contos do APM, cx 87, item3; Seção Colonial, TP 114. Registro de Terras de Leopoldina. nº 56, nº 77 e nº 78 
Igreja N. S. da Piedade, Barbacena, MG, lv bat 1811-1830 fls 128v; lv cas 1795-1812 fls 199; lv cas 1808-1826 fls 1v; lv bat 1788-1798 fls 454 
Inventários de Ana Francisca Garcia, Felisberto da Silva Gonçalves, João Ignacio de Souza e Inventário de Manoel José de Novaes. 
TRINDADE, Cônego Raimundo. Velhos Troncos Mineiros. São Paulo: Gráfica Revista dos Tribunais, 1955. v.2 p.198/199

174 – Fazenda Recreio

Logomarca Trem de História

Entre os atuais córregos das Palmeiras e das Virgens, Antonio José Dutra e Mariana Teresa Pereira Duarte formaram a fazenda a que denominaram Recreio, que foi registrada[1] em 1856 pela então viúva, declarando terem sido comprados 417 alqueires sem declarar data ou vendedor.

Antonio José e Mariana se casaram[2] no dia 11 de novembro de 1822 em Barbacena. Ela foi batizada[3] em Ibertioga aos 03 de junho de 1807, sendo filha de Antonio Pereira da Cunha e Teresa Maria Duarte. Teve como madrinha de batismo a sua meia irmã Joaquina Beralda de Santana, mãe de seu futuro marido Antonio José Dutra. No inventário do pai[4] de Mariana, consta que em solteiro ele teve uma filha de nome Joaquina Beralda de Santana que se casou com Manoel José Dutra.

Em 1831 o casal Antonio José e Mariana residia em Santa Rita de Ibitipoca com as filhas Rita (nascida em 1825), Constança (1826) e Maria, além de uma pessoa de nome Joaquina, viúva, que poderia ser a mãe de Antonio José. Não se sabe, ainda, quando se transferiram para o Feijão Cru, pois não aparecem nas contagens populacionais de 1835 e 1843.

Sabe-se que o casal teve, pelo menos, mais três filhos nascidos no Feijão Cru: Ana Eugênia, José Tomaz e João José.

Também não se sabe quando Antonio José faleceu, podendo-se apenas informar que foi antes de novembro de 1854, data da medição[5] e estabelecimento das divisas entre as fazendas Recreio e Santa Cruz, aquela pertencente a Mariana Teresa Pereira Duarte e esta a José Thomaz de Aquino Cabral.

Quanto à localização dessa fazenda sabe-se que ao registrar sua propriedade, Mariana Duarte declarou divisas com a fazenda Santa Cruz, de José Tomaz de Aquino Cabral, com Francisco da Silva Barbosa (Boa Vista), Manoel José de Novaes (Saudades), Antonio Carlos da Silva Teles Faião (Barra das Laranjeiras) e Bento Rodrigues Gomes (Cachoeira do Bagre). No Retombo assinado pelo agrimensor Antonio Jacinto Muniz, aos 22 de novembro de 1874, a localização foi indicada como tendo[6] “vertentes para os córregos Recreio e João Ides”.

É possível que este João Ides tenha alguma relação com João Ides de Nazareth Filho, cuja segunda esposa era filha do pioneiro Joaquim Ferreira Brito. E pode ter sido ele o vendedor das terras adquiridas por Antônio José Dutra, já que sua primeira esposa era sobrinha dos dois beneficiários com as sesmarias doadas em 1818, os irmãos Fernando e Jerônimo Corrêa de Lacerda.

No dia 10 de março de 1877 foram convocadas 65 pessoas, algumas delas acompanhadas dos respectivos cônjuges, para o julgamento da sentença do Retombo[7] das fazendas Santa Cruz e Recreio. O memorial descritivo esclarece que o processo foi iniciado na divisa da Fazenda Recreio com a Fazenda dos Barbosa (Boa Vista), cujo marco era a “junção do córrego dos Barbosa com o ribeirão do Recreio” e seguiu pelo “caminho que vai ao Laranjal”. Cita confrontações com propriedades menores, oriundas de desmembramentos da fazenda Águas Vertentes do Córrego do Moinho e da fazenda Cachoeira Alta do Bagre, até retornar ao ponto de partida da medição.

Para a finalização do trabalho, os interessados entregaram seus títulos de posse e outros documentos probatórios, como escrituras particulares de venda que os herdeiros fizeram de parte de suas legítimas, e o agrimensor declarou que a divisão e demarcação das fazendas Santa Cruz e Recreio resultaram em dois quinhões de 187 alqueires e 3 quartas para Mariana Tereza Pereira Duarte e igual área para José Tomaz de Aquino Cabral.

Muito provavelmente Mariana faleceu pouco tempo depois de encerrado o processo. Embora não tenha sido encontrado seu inventário, a conclusão advém de novo processo para divisão da mesma propriedade, agora entre os herdeiros. Aos 7 de outubro de 1879 o mesmo agrimensor assinou[8] a Derrota da medição amigável da fazenda, tendo encontrado 92 alqueires, indicação de que os herdeiros já haviam vendido partes de suas legítimas.

Os herdeiros citados foram os irmãos João José, José Tomaz e Ana Eugênia e seus respectivos cônjuges. Entre os confrontantes havia herdeiros da Fazenda Boa Vista dos Barbosas, da Águas Vertentes e da Cachoeira do Bagre. Tais propriedades foram citadas desde a declaração de Mariana em 1856, o que demonstra que as partes vendidas da fazenda ficavam ao sul, especialmente nas divisas com a fazenda Santa Cruz.

Em 1883, o que restava da fazenda Recreio voltou a ser objeto de divisão amigável entre dois condôminos: João José Tomaz Dutra, filho dos formadores da propriedade, e Vicente Rodrigues Ferreira, filho do formador da fazenda Cachoeira do Bagre e casado com uma filha do formador da fazenda Águas Vertentes. Naquela altura a propriedade havia encolhido para 73 alqueires[9] e entre os confrontantes estavam os irmãos de João José, José Tomaz Dutra e Ana Eugênia Duarte, que haviam separado seus quinhões após o retombo de 1880.

Menos de dez anos depois, morreu João José Dutra. Sua viúva, Maria Antonina de Castro, casou-se pela segunda vez com um herdeiro da Fazenda Fortaleza. Mas isto é assunto para uma das futuras viagens do Trem de História porque a próxima terá como destino uma das propriedades vizinhas à Fazenda Recreio. Até lá!

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 426 no jornal Leopoldinense, novembro de 2021

Fontes consultadas: 
[1] Registro de Terras de Leopoldina (Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114), nº 66. 
[2] Igreja N. S. da Piedade, Barbacena, MG, lv cas 1808-1826 fls 173v 
[3] idem, lv bat 1740-1816 fls 127
[4] Museu Regional de São João del Rei, caixa 43, ordem 20
[5] Divisão amigável das fazendas Recreio e Santa Cruz. Processo 38402027 COARPE - TJMG, img 36.
[6] idem, img 37
[7] Idem, imgs 46-53.
[8] Divisão amigável da fazenda Recreio. Processo 38402779 COARPE – TJMG, img 9
[9] Divisão amigável da fazenda Recreio. Processo 38403387 COARPE - TJMG, img 73

172 – O vizinho Antonio Carlos da Silva Teles Faião e a divisão das grandes propriedades

O Trem de História traz hoje um dos vizinhos do pioneiro Antonio Rodrigues Gomes. E dá início a sua história informando que, embora só tenha chegado por aqui quando o Sertão do Feijão Cru já contava com um arraial e a matriz de São Sebastião, Antonio Carlos da Silva Teles Faião situa-se entre os pioneiros por ter participado do movimento de expansão que resultou na emancipação quase quinze anos depois.

Nascido em Simão Pereira por volta de 1801, Antonio Carlos era filho de José Ferreira da Silva Teles Faião e Felicia Josefa de Souza, sendo neto paterno de Antonio Ferreira da Silva e Ana Maria Ribeiro Teles Faião e neto materno de Francisco José Ferreira de Souza e Antonia Rita de Jesus Xavier, irmã do Alferes Tiradentes. Casou-se[1] em Santo Amaro de Camapuã, Conselheiro Lafaiete, com Francisca Candida de Jesus ali nascida, filha de Joaquim José de Andrade, neta paterna de João Cristóstomo de Magalhães e Bárbara Maria Dias e neta materna dos mesmos avós maternos de Antonio Carlos.

Registre-se que o estudo da ascendência do casal teve a colaboração do correspondente Carlos Henrique Resende cuja cópia de seu trabalho[2] veio confirmar a hipótese dos autores desta série em contraposição a Arthur Rezende na Genealogia Mineira. Diferentemente do que publicou o respeitado genealogista mineiro, a família Teles Faião não migrou para Leopoldina, mas para a Serra da Canastra. Apenas o filho Antonio Carlos veio para o Feijão Cru por volta de 1840, tendo adquirido[3], além das terras vizinhas a Antonio Rodrigues Gomes, outros 32 alqueires da Fazenda São Luiz, de Antonio Prudente de Almeida, onde fundou o Sítio Conceição e aí se instalou com a esposa e a filha Vicencia Antonia que se casou com um dos proprietários da fazenda Santa Cruz, da qual se falará na próxima edição do jornal.

No registro de terras realizado em 1856, Antonio Carlos da Silva Teles Faião[4] não indicou o nome de sua propriedade. Entretanto, na divisão[5] promovida por seu genro consta que o nome original de tal propriedade era Fazenda Barra das Laranjeiras. O adquirente havia descrito suas terrras informando localizar-se na margem direita do Rio Pomba, nas vertentes até a barra do Ribeirão denominado Recreio (atual Ribeirão das Virgens), com 140 alqueires que comprou de José Thomas d’Aquino Cabral, Carlos Augusto de Aquino Cabral e Sebastião Gomes Teixeira Jalles. Mais tarde a Barra das Laranjeiras teve seu nome mudado para Fazenda Natividade.

Por tais indicações, suspeita-se que o terço final do atual Córrego dos Barbosa tivesse o nome de Córrego das Laranjeiras.

Teles Faião declarou que sua propriedade fazia divisa ao norte com o Rio Pomba e seguia pelas divisas com Manoel José de Novais (fazenda Saudades), Francisco da Silva Barbosa (Boa Vista), Mariana Teresa Pereira Duarte (fazenda Recreio), Antonio Rodrigues Gomes (Águas Vertentes), Bento Rodrigues Gomes (Cachoeira do Bagre), Joaquim Firmino e seus cunhados (Santana do Pomba). Este último era genro de Genoveva Maria de Jesus, da fazenda Santana do Pomba, comentada pelo Trem de História nos textos 156 e 157, cuja sede ficava no local onde mais tarde foi construida a Estação Vista Alegre da Estrada de Ferro Leopoldina. Quanto aos demais vizinhos declarados, não foi possível comprovar todos eles, já que a área adquirida por Teles Faião era menor do que a compreendida pelas divisas entre os confrontantes mencionados e alguns deles não declaram ter divisas com Teles Faião.

Ressalte-se que as informações prestadas por Teles Faião no registro de 1856 foram importantes para localizar as propriedades indicadas no parágrafo anterior, pois ao citar o Ribeirão Recreio permitiu fazer a medição da área compreendida entre o Rio Pomba, na altura da Estação Vista Alegre, as vertentes do Ribeirão que então se denominava Recreio por conta da fazenda homônima, e o Córrego do Moinho onde estava a propriedade de Antonio Rodrigues Gomes.

Como tem sido afirmado em diversas oportunidades, é necessário utilizar-se de conhecimentos desenvolvidos por pesquisadores de várias ciências, assim como dos instrumentos a elas pertinentes para que se possa compreender a ocupação do território do Feijão Cru. Entre estes instrumentos estão os documentos cartográficos que, embora espaçados no tempo, conservam marcações importantes para o estudo. No caso da localização das antigas propriedades, a fonte mais antiga foi produzida[6] pelo cartógrafo João José da Silva Teodoro em 1847 e nela se encontram os nomes de 242 proprietários ou de suas propriedades então localizadas na área que veio a formar a Villa Leopoldina pouco mais de seis anos depois. A próxima informação cartográfica[7] é de 1926 e nela se conservam muitos nomes das primeiras fazendas. O exercício se completa na transposição das informações de Teodoro e da Carta de 1926 para a Carta[8] de Leopoldina de 1977, permitindo, então, uma visão panorâmica das unidades agrícolas no início do povoamento.

Pelo que se conhece da história escrita de Leopoldina, não parece ter havido consulta a fontes que descortinam como e quando se deram as divisões das antigas propriedades. E é de se supor que o desinteresse pelo assunto talvez encontre respaldo numa visão romântica tardia.

Segundo Saliba[9], o sonho de uma sociedade harmoniosa embalou o fazer de filósofos, artistas, escritores e pensadores até o período das revoluções de 1848 em que a denominada “primavera dos pobres”, na Europa, buscava o fim da política da “tradição” e perpetuação de uma mesma classe no poder.

Ainda que o movimento tenha demorado a atravessar o Atlântico, não se justifica que no século XX os escritores da nossa história continuassem presos à esta visão romântica que incluía latifúndios, escravaria incalculável e muitas benesses, quando é sabido que a Leopoldina da segunda metade do século XIX era outra, com novos atores sociais assumindo o controle de sua força de trabalho.

Há mais de vinte anos os autores do Trem de História estudam o movimento imigrante no município, tendo observado que muitos deles se tornaram proprietários e não só na Colônia Agrícola da Constança. E foi o estudar o processo de divisão das antigas fazendas que resultou em compreender a região mostrada no esquema do texto anterior, onde estava a Fazenda Barra das Laranjeiras. Região que em 1920 estava pontilhada de pequenas propriedades, conforme registrou o Censo[10] daquele ano e por onde o Trem de História seguirá viagem no próximo Jornal trazendo as fazendas Santa Cruz e Natividade. Até lá!

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 424 no jornal Leopoldinense, setembro de 2021


Fontes consultadas: 
[1] ASSIS, João Paulo Ferreira de. Polis 30 Um resgate da história dos municípios. Ressaquinha-MG: s.n., 1998-2003. nº 48 fls 19. 
[2] RESENDE, Carlos Henrique. Resendes e Rezendes. Juiz de Fora-MG: monografia, 2019. p 6 
[3] Registro de Terras de Leopoldina (Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114), nº 29. 
[4] idem), nº 8. 
[5] Divisão da Fazenda Natividade.  Processo 38404852 – COARPE - TJMG, img 8 
[6] TEODORO, João José da Silva. Carta Topográfica dos Termos do Presídio, Pomba e São João Nepumuceno (Acervo da Biblioteca Nacional: 1847). 
[7] Commissão Geographica e Geologica de Minas Geraes. Carta Geográfica de Cataguases Folha nº 20 S2 E3. São Paulo, Cayeiras e Rio: Secção Cartographica da Companhia Melhoramentos (Weisflog Irmãos incorporada), 1926. 
[8] Diretoria de Geodésia e Cartografia do IBGE – Superintendência de Cartografia. Carta de Leopoldina extraída da Carta do Brasil 1:50.000 Folha SF-23-X-D-V-2. 1977 
[9] SALIBA, Elias Thomé. As utopias românticas. 2.ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p. 90 
[10] Ministerio da Agricultura, Industria e Commercio. Directoria Geral de Estatística. Recenseamento do Brazil realizado em 1 de setembro de 1920. Rio de Janeiro: Typ. Da Estatistica, 1924. v.2 328-344

169 – Antônio Rodrigues Gomes

Logomarca Trem de História

Como foi dito na viagem anterior, Antônio Rodrigues Gomes se casou com Rita Esméria de Almeida, filha de Manoel Antônio de Almeida e Rita Esméria de Jesus. Com ela teve pelo menos 12 filhos, sendo 5 nascidos no Curato do Feijão Cru.

Aqui chegando em 1829, Antônio declarou[1] que adquiriu 200 alqueires de terras de Francisco Pinheiro Corrêa de Lacerda, encarregado de vender as duas sesmarias doadas aos irmãos Fernando e Jerônimo Corrêa de Lacerda, tios do vendedor.

Antônio denominou sua propriedade como Águas Vertentes e informou que se localizava no Córrego do Moinho, sendo seus vizinhos José Tomaz de Aquino Cabral (Fazenda Santa Cruz), Mariana Pereira Duarte (Fazenda Recreio), João Gualberto Ferreira Brito (Fazenda Fortaleza), Antônio Joaquim Teixeira e seu irmão Bento Rodrigues Gomes. Além destes vizinhos, ainda se tem o registro de Antônio Carlos da Silva Teles Faião informando que sua propriedade, que se estendia das vertentes até a barra do Ribeirão Recreio, fazia divisa com Antônio Rodrigues Gomes.

Segundo Barroso Junior[2], Antônio Rodrigues Gomes foi o escrivão da doação que Joaquim Ferreira Brito fez para constituir o Patrimônio de São Sebastião do Feijão Cru no dia 01 de junho de 1831.

Antônio faleceu[3] em Leopoldina aos 13 de fevereiro de 1866.

Os filhos

Antônio e Rita Esméria de Almeida tiveram os filhos:

1) Maria Constança de Jesus cc Antônio de Almeida Ramos, filho de Manoel Antônio de Almeida e Rita Esméria de Jesus. O casal viveu na Fazenda Boa Vista, em Tebas, propriedade desmembrada da fazenda Feijão Cru, dos pais do marido; 2) Manoel Rodrigues do Nascimento cc Ana Esméria de Jesus, com quem viveu no distrito de Cataguarino, Cataguases; 3) Francisco Rodrigues Gomes de Almeida cc Maria Umbelina da Anunciação, filha de Bernardo José Gonçalves Montes e Maria Antônia de Jesus. O casal viveu na Fazenda Sossego, de Bernardo José; 4) Luciana Francelina da Anunciação cc Vicente Rodrigues Ferreira, filho de Bento Rodrigues Gomes e Ângela Joaquina de Jesus.O casal é citado como vizinho e/ou condômino nas fazendas Recreio, de Mariana Pereira Duarte e depois João José Dutra; fazenda Santa Cruz, dos Aquino Cabral, sítios Aracaty e Porangaba dos Costa Cruz e Alves Ribeiro. Compraram parte da fazenda Boa Vista, na mesma região onde viviam os pais de ambos; 5) Mariana Esméria da Natividade cc José Joaquim Pereira Garcia e numa segunda união com Antônio Joaquim Teixeira Filho, filho de Antônio Joaquim Teixeira e Lina Rosa da Trindade. Com o segundo marido, viveu na fazenda do pai dele que era vizinha do pai dela; 6) Ignacio Rodrigues Gomes cc Delfina Ignacia de Moraes, filha de Antônio Luiz de Moraes e Rita de Cássia de Almeida. O casal era vizinho das fazendas Recreio e Santa Cruz, de João José Dutra, tendo vivido na fazenda São Manoel da Bocaina onde o pai de Delfina era condômino; 7) Joaquina Eucheria de Jesus cc Josué de Vargas Corrêa, filho de Francisco de Vargas Corrêa e Teresa Maria de Jesus. O casal tinha quinhão na fazenda Santa Cruz, de João José Dutra e doou terreno para o cemitério de Vista Alegre em 1899; 8) Messias Rodrigues Gomes cc Francisco Ferreira Neto, filho de Manoel Ferreira Brito e Maria Josefa da Silva. Foram proprietários da fazenda Laranjeiras, de Recreio, vizinhos das fazendas Santa Clara, Recreio, São Manoel da Bocaina e Boa Vista. Ele foi vereador, presidente do conselho distrital de Recreio e diretor-presidente do Banco de Leopoldina; 9) Venancia Esméria de Jesus cc Francisco de Vargas Corrêa [filho], filho de Francisco de Vargas Corrêa e Teresa Maria de Jesus. Foram vizinhos da fazenda Constança, arrematantes de parte da fazenda Independência e condôminos da fazenda Alto da Serra; 10) Ana Rodrigues Gomes cc José Amâncio de Menezes, filho de Antônio José de Menezes e Joaquina Margarida, casal que adquiriu terras da fazenda Província, em Itapiruçu, Palma; 11) João Rodrigues Gomes cc Messias Ferreira Damasceno, filha de João Damasceno Ferreira e Rita Joaquina de Jesus.O casal era confrontante da fazenda Monte Alegre, tendo vivido na propriedade do pai de Messias, na fazenda Santa Clara; e, 12) Rita Guilhermina de Jesus cc Josué de Vargas Corrêa, filho de Francisco de Vargas Corrêa e Teresa Maria de Jesus.Confrontante das fazendas Recreio e Santa Cruz, com quinhão nesta última.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 421 no jornal Leopoldinense, junho de 2021

Fontes consultadas:


[1] Registro de Terras de Leopoldina. Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114, termo 37 
[2] BARROSO JÚNIOR. Leopoldina e seus primórdios. Rio Branco: Gráfica Império, 1943: notas da pag 61 
[3] Inventário de Antônio Rodrigues Gomes processo 38404808 COARPE / TJMG fls 4v img 6.