![]() Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA Terceira parte do trabalho A Imprensa em Leopoldina (MG) entre 1879 e 1899 Neste tempo de muito falar sobre financiamento de campanha e contabilidade criativa para que a grana não saia dos trilhos, o Trem de História conta um pouco sobre os caminhos percorridos para o financiamento dos periódicos e as influências que exerciam sobre a linha editorial de um jornal. E o ponto de partida para a viagem de hoje é a edição nº 40 do ano 3, de 25.05.1882, d’O Leopoldinense, que na primeira página traz um aviso com os preços cobrados para veicular declarações, publicações solicitadas, avisos e anúncios, esclarecendo-se que “adotamos os preços moderadíssimos do Diário do Brasil”, de onde se extrai primeira constatação interessante. A notícia em si, indicando uma das formas de financiamento do jornal, pouca novidade tem. Mas nela o editor do Leopoldinense deixou entrever que seu jornal acompanhava o Diário do Brasil, periódico publicado na Corte, que foi incluído por Nelson Werneck Sodré, em A História da Imprensa no Brasil, entre os órgãos da pequena imprensa que se isolou no apoio ao manifesto de Carl von Koseritz, em 1883, de incentivo à imigração germânica. O Diário do Brasil era um informativo classificado pelo jornalista francês Max Leclerc entre os que “exerciam grande influência na opinião” e, como se vê, servia de parâmetro para O Leopoldinense. Isto faz crer, com boa margem de segurança, que não teria sido por mero acaso que O Leopoldinense se colocou, em diversas oportunidades, a favor da substituição da mão de obra escrava por colonos estrangeiros. Recorde-se que o tema da imigração foi estudado pelos autores deste Trem de História em projeto desenvolvido há alguns anos sobre a Colônia Agrícola da Constança. Naquela oportunidade afirmou-se mais de uma vez que os fazendeiros leopoldinenses adotaram a ideia da contratação de colonos estrangeiros a partir do início da década de 1880 e a substituição da mão de obra foi um processo crescente, não se justificando a visão de que o 13.05.1888 desestruturou todas as propriedades agrícolas do município. Recorde-se, ainda, que entre outras fontes utilizadas naquele estudo estão as matérias publicadas em jornais, especialmente as colunas d’O Leopoldinense e da Gazeta de Leopoldina que divulgavam a chegada de imigrantes na Hospedaria Horta Barbosa, em Juiz de Fora. Voltando à fonte de financiamento do primeiro periódico leopoldinense, vale observar que ela traz um indicador importante. Analisando a denominada Seção Livre, observa-se que o jornal publicava matérias relativas a diversos municípios que não faziam parte da área de influência de Leopoldina, o que indica uma boa receptividade do jornal numa região mais vasta. Embora não tenha sido possível identificar com precisão todo o universo dos assinantes do jornal, pode-se concluir, por hipótese, que além dos moradores de localidades próximas os houvesse em diferentes pontos das províncias de Minas e Rio, além da Corte, o que por si só amplia bastante a sua possibilidade de financiamento através das assinaturas. E esta ampliação pode ser observada em anúncio na primeira página da edição de 19.11.1881 informando que as assinaturas poderiam ser pagas num endereço na capital do Império – Rua da Quitanda 84-B, onde se estabelecia a empresa Portella & C. que recebia, também, assinaturas tomadas por moradores de outras cidades. Segundo o próprio jornal era possível, também, pagar a assinatura diretamente, através de remessa de vale postal, como fez um padre de Valença, RJ, em 1881. Uma fonte importante de financiamento, não só para O Leopoldinense, sempre foi a proveniente das publicações oriundas da administração municipal e do poder judiciário. Neste ponto é importante lembrar que as receitas destas publicações algumas vezes traziam consigo seus prós e contras. Assim, em alguns casos, pareciam constituir-se na razão para a existência de uma folha informativa. Noutros, agraciados com maior ou menor volume de recursos, podiam ser confundidos com algum favor concedido ou negado devido à cor da bandeira partidária assumida por seu editor. Outra forma de financiamento dos periódicos eram as colunas com noticiário religioso. Segundo consta em alguns dos “papeizinhos” do Padre Julio Fiorentini, que estava à frente da Paróquia de São Sebastião nos últimos anos do século XIX, eram feitas arrecadações específicas pelas irmandades para publicação de anúncios no jornal. Esclareça-se que tais papeizinhos foram encontrados dentro de livros de assentos paroquiais de batismo transcritos pelo Padre José Ribeiro Leitão em dezembro de 1958, não estando organizados ou arquivados de forma a permitir sua referenciação. Completando-se o rol de meios para obtenção de fundos para financiamento dos periódicos, há a indicação de venda avulsa realizada por “moleques” esporadicamente mencionados. Contudo, apesar do preço da assinatura ser informado sempre na primeira página, no caso d’O Leopoldinense não foi encontrado o valor para venda avulsa. Conhecidas as fontes de influência e financiamento dos periódicos o próximo vagão promete falar de literatura, jornalismo e política. Aguardem. Ele vem puxado pela Maria Fumaça, mas é rapidinho. |
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2 – O Público Alvo dos Periódicos
Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA Continuação do trabalho A Imprensa em Leopoldina (MG) entre 1879 e 1899 Como foi dito no artigo anterior, o trem de história traz hoje o vagão da pesquisa sobre o público alvo dos periódicos. Isto é, o pessoal que devia sentar no banco do trem, na espreguiçadeira do alpendre ou, na cadeira da sala para ler o jornal. E começa pelo mais antigo jornal da cidade que se chamou “O Leopoldinense”. Este periódico teve como seu primeiro editor e gerente o Alferes Francisco da Costa Sobrinho. Sua primeira edição data de 01.01.1879 mas só existem em arquivo os números publicados a partir de novembro de 1880. Era “propriedade de uma sociedade anônima” cujos membros podem apenas ser suspeitados, já que não se encontraram fontes que os identificassem. Apresentava-se como “Folha Comercial Agrícola Noticiosa”, trazendo o subtítulo “Consagrado aos Interesses dos Municípios de Leopoldina e Cataguases”, o seu público alvo declarado. Abra-se aqui um parêntese. O subtítulo acima se confirma pelo fato de que a publicação surgiu quando havia apenas três anos e dois meses que Cataguases se emancipara de Leopoldina e somente um ano e quatro meses da instalação daquele município. Registre-se, ainda, que é possível constatar, em matérias publicadas no jornal e em documentos do Arquivo da Câmara Municipal de Leopoldina, como os livros dos cartórios de notas, que por esta época Cataguases ainda mantinha certo nível de dependência em relação a Leopoldina e que, além disso, ali a imprensa periódica só apareceu cinco anos depois, em 1884, conforme Xavier da Veiga. Seria, entretanto, uma simplificação perigosa afirmar que O Leopoldinense tinha como público alvo apenas os moradores de Leopoldina e Cataguases. Até porque as divisões administrativas nem sempre correspondem ao que se observa na realidade. O público do jornal poderia ser constituído pelos 59.390 habitantes da área imediata de influência de Leopoldina e não somente dos que residiam no território então pertencente ao município. E para entender esta ampliação do público alvo basta lembrar o fato de que alguns dos distritos emancipados estavam subordinados a municípios onde ainda não havia imprensa periódica. Porque além de Cataguases, já mencionado, este é o caso dos distritos que foram transferidos para Mar de Espanha, Muriaé e São João Nepomuceno, como pode ser deduzido da obra de José Xavier da Veiga, quando mostra que o primeiro jornal de Mar de Espanha é de 1882 e informa que em Muriaé e São João Nepomuceno os primeiros apareceram somente em 1887. Importante destacar que, do total de moradores (59.390) apurado em 1872, apenas 65,54% deles eram cidadãos livres, o que poderia levar à conclusão de que o mercado do jornal seria de 38.924 pessoas, das quais apenas 9.010 eram alfabetizadas. Entretanto, o baixo índice de alfabetização não se torna totalmente excludente por conta de notas encontradas em vários jornais consultados, as quais confirmam a opinião de Walmir Silva, em A Imprensa e a Pedagogia Liberal na Província de Minas Gerais, que citando Gramsci afirma que: “o referido público não se resumia a letrados, sendo condição da pedagogia liberal alcançar os simples”. E conforme o mesmo autor, a oralidade teve grande importância num ambiente de baixa alfabetização: “a circulação dos periódicos e sua leitura pública alimentavam uma elite intelectual moderada, em sentido amplo”. No mesmo sentido coloca-se Marcus J. M. de Carvalho, em A Imprensa na Formação do Mercado de Trabalho Feminino no Século XIX, ao mencionar a leitura em voz alta e também a frequência aos locais de concentração de pessoas como osmeetings e clubs, para ter acesso à informação. Aliás, Carvalho referiu-se a uma expressão interessante ao declarar que as novidades chegavam através das conversas com agregados, com os escravos de dentro de casa ou com vizinhos. Afirmou ele: “vestidos e ideias francesas vinham na mesma embalagem” cuja ideia central remete ao processo da Inconfidência Mineira, de inspiração francesa. E para sintetizar as referências à influência dos costumes da França na sociedade brasileira, presentes em inúmeras obras, cita-se aqui a Revista Gragoatá, da Universidade Federal Fluminense, volume 10-13, de 2001, com um artigo intitulado “As ideias francesas [chegaram ao Brasil] nos movimentos preparatórios da Independência”. Este aspecto foi observado, nos jornais de Leopoldina analisados para este trabalho, em situações tais como citações naquela língua, anúncio de livros de autores franceses e comentários sobre a moda parisiense. Presume-se, portanto, que o francesismo era sinal distintivo e o público leitor estava a ele habituado. Adicionalmente, a análise de anúncios de cursos livres ou regulares na cidade demonstra que havia interesse pelo aprendizado da língua de Rousseau. Fechando o artigo de hoje, resta dizer que em fevereiro de 1881 o subtítulo do Leopoldinense passou a ser “Dedicado à Causa Pública e Social”, embora não se tenha observado mudança editorial ou de público nos exemplares posteriores. Em maio de 1882 ocorreu uma significativa alteração no jornal ao ser desfeita a sociedade Costa Sobrinho & C, ficando todo o ativo e passivo da tipografia, bem como a casa de negócio situada à Rua do Rosário nº 37, a cargo do sócio Francisco da Costa Sobrinho, conforme nota publicada na primeira página da edição nº 39, de 21 de maio daquele ano. Quanto à linha editorial, estrutura do periódico e público alvo, as edições subsequentes não trazem modificações. No próximo número o Trem da História seguirá a sua viagem. |
A Imprensa em Leopoldina (MG) entre 1879 e 1899
01 – APRESENTAÇÃO E INÍCIO DA HISTÓRIA
Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA Publicado no jornal Leopoldinense de 16 jun 2014 Iniciamos com este, a publicação de alguns textos que pretendemos sejam como um TREM DE HISTÓRIA a levar ao leitor do Jornal Leopoldinense um pouco do passado da cidade. E, numa primeira série de artigos, nossa imaginária Maria Fumaça trará para o público da gare a história da Imprensa em Leopoldina-MG no período de 1879 a 1899. Isto porque segundo Xavier da Veiga na monumental obra intitulada Efemérides Mineiras, Leopoldina figura entre os municípios mineiros com maior presença da imprensa periódica neste período. E porque no dizer de Maria Beatriz Nizza da Silva, no livro Gazeta do Rio de Janeiro (1808-1822), os jornais são fontes preciosas para o historiador como documento da vida cotidiana, permitindo observar aspectos “que dificilmente se encontram em outra documentação”. Embora não se conheça estudo que discuta o papel desta imprensa em Leopoldina, o município teve bom destaque histórico e econômico na zona da mata mineira, o que por si só justifica explorar as fontes desta história. Serão textos inéditos, baseados em trabalho de Nilza Cantoni para o curso de pós graduação em História Cultural pela Universidade Gama Filho. Assunto ainda não tratado por estudiosos, aqui será apresentado o resultado de uma investigação que procurou reunir e sintetizar uma abordagem panorâmica, identificando os periódicos existentes no período pesquisado, o público atingido e o papel desses jornais locais na difusão da cultura. Lembrando que para este trabalho Nilza leu e analisou quinhentas e onze edições de cinco periódicos da época, sendo possível identificar que as matérias tratavam de Administração Pública, Agroindústria, Educação, Escravidão, Imigração, Literatura, Poder Judiciário, Política, Religião, Serviços Públicos, Social, Transportes e Variedades. No correr dos artigos notará o leitor que foi de fundamental importância a análise de algumas das primeiras edições do pioneiro jornal O Leopoldinense, lançado em 1879. Especialmente matérias que declaravam ser sinal de modernidade a libertação dos escravos, bem como de outras que abordavam a necessidade de melhorar a capacidade de produção agrícola. Leituras que permitiram esboçar um panorama da sociedade da época, despertando para o “estudo de um saber local nos moldes históricos” de que Lynn Hunt, em A Nova História Cultural, trata ao definir o que é a História Local. Donde duas questões se destacaram: saber quais eram os assuntos em pauta no período e de que forma eles eram abordados. Fato é que, manuseando este rico material, Nilza tirou algumas conclusões interessantes e constatou, por exemplo, que os primeiros jornais de Leopoldina funcionaram muitas vezes como os almanaques da época, os quais formavam uma coletânea de informações que se destinavam a instruir o público leitor a respeito dos mais variados assuntos. Concluiu, ainda, que aqueles periódicos se propunham a atuar na formação de um público leitor que viria a se tornar consumidor de outros jornais e dos livros divulgados nas quartas páginas daqueles periódicos. Mas para que o leitor também possa tirar as suas próprias conclusões, necessário se faz que a viagem prossiga para descobrir que o município de Leopoldina, situado na zona da mata de Minas Gerais, no final do século XIX contou com diversas publicações periódicas. Segundo Xavier da Veiga teriam sido dezesseis os jornais que aqui se imprimiram no último quartel dos anos de mil e oitocentos. Entretanto, a pesquisa elevou este número para vinte e um títulos lançados, além de um Almanaque. E para finalizar o artigo de hoje, é de se destacar que de alguns destes informativos só foram localizadas esparsas referências em outros periódicos ou em literatura. Mas aprimorando-se as buscas, foi possível encontrar edições de doze deles, sendo que alguns no Arquivo Público Mineiro, em Belo Horizonte, outros na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro e ainda outros, na Biblioteca Municipal Luiz Eugênio Botelho e na Casa de Leitura Lya Maria Müller Botelho, em Leopoldina. E aqui é preciso registrar um agradecimento especial aos funcionários da Casa de Leitura, especialmente ao seu diretor Alexandre Moreira, que facilitaram o acesso da pesquisadora à única coleção completa da Gazeta de Leopoldina de que se tem notícia. No segundo vagão se falará sobre público alvo destes periódicos. Até lá! |