Como ficou prometido no número anterior, o Trem de História continua falando sobre o autor que, em 1864 publicou as mais antigas informações sobre Leopoldina, o tenente-coronel Joaquim Antonio de Almeida Gama. Hoje, para identificar seus antepassados.
Joaquim Antonio era filho de Antonio Francisco de Almeida e Gama e de Inocencia Claudina da Costa que se casaram em Rio Preto, MG aos 12.07.1812. Ele, natural de São João del Rei onde nascera por volta de 1788, filho de Caetano José de Almeida Gama e de Antonia Maria Custódia Dias.
Sabe-se que Inocencia recebeu o sacramento do batismo(1) em Conceição de Ibitipoca em 02.10.1797 e que era filha de João Rodrigues da Costa [filho] e de Vicencia Faria Corrêa de Lacerda. Portanto, neta materna de Antonio Carlos Corrêa de Lacerda e Ana de Souza da Guarda, casal que teve muitos descendentes radicados em Leopoldina e cujos filhos Fernando Afonso e Jerônimo foram beneficiados com duas sesmarias no Feijão Cru. Vicencia nasceu e foi batizada(2) em Bom Jardim de Minas em 07.07.1759 e lá mesmo teria se casado.
Vale lembrar que Conceição de Ibitipoca, onde Inocencia nasceu, é distrito de Lima Duarte e faz divisa com Bom Jardim. Considerando-se o parentesco e a proximidade das localidades de origem, é lícito supor que Joaquim Antonio de Almeida Gama tenha sido atraído para o Feijão Cru pelos sobrinhos de sua mãe, Romão e Francisco Pinheiro Corrêa de Lacerda, que para cá haviam migrado por volta de 1830, com o objetivo de ocupar e vender as sesmarias doadas aos tios acima citados.
A avó paterna de Joaquim Antonio, a senhora Antonia Maria Custódia Dias, era filha do português de Barcelos, Manoel Martins Gomes e de Maria de Siqueira Paes, natural de São Paulo e falecida(3) no dia 28.10.1776. Já o avô paterno, Caetano José de Almeida Gama, era filho de Manoel Gomes Vilas Boas e Inacia Quiteria da Gama, sendo esta, filha de Luiz de Almeida Ramos que, por sua vez, era filho de Manoel de Paiva Muniz e Maria Ramos da Costa. Da mãe de Inacia Quiteria da Gama vem este último sobrenome. Chamava-se Helena Josefa Corrêa da Gama, sendo filha de Leonel da Gama Bellens e de Maria Josefa Corrêa, falecida(4) em 1737.
Registre-se que Joaquim Antonio veio para o Feijão Cru na mesma época de seu tio paterno, Francisco Antonio de Almeida e Gama, casado(5) em Bocaina de Minas, no dia 13.09.1812, com Maria Perpétua de Jesus que já havia falecido em 1843 quando o marido e o filho Caetano José foram recenseados no Feijão Cru. Além deste filho, sabe-se que Francisco Antonio e Maria Perpétua foram pais, também, de Joaquim Firmino que surge nas fontes leopoldinense na década de 1850, casado com Joaquina Francisca de Jesus. Já o Caetano José de Almeida Gama era casado com Carolina Teodora de Castro, com quem teve oito filhos em Leopoldina, entre 1851 e 1868.
Segundo o Registro de Terras de 1856, Francisco Antonio de Almeida Gama tinha duas propriedades. A primeira, em conjunto com seu filho Caetano José de Almeida Gama, com o nome de Fazenda Circuito(6), localizava-se numa ilha do Rio Pardo e media cerca de 220 alqueires. A outra chamava-se Fazenda Bom Retiro(7), media cerca de 70 alqueires e se localizava na margem do Rio Pomba, sendo que uma de suas divisas era com a Fazenda Benevolência, de Albina Joaquina de Lacerda, então viúva de Ignacio de Souza Werneck. Albina era filha de Álvaro Pinheiro de Lacerda e Angela Maria do Livramento, sendo meia-irmã de Romão e Francisco Pinheiro Corrêa de Lacerda e também sobrinha dos beneficiários de sesmarias que foram divididas e vendidas antes da formação do Distrito do Feijão Cru.
Por hoje o Trem de História fica por aqui. Mas voltará no próximo número do Jornal para continuar contando a história desta personalidade que ficou esquecida pelos historiadores leopoldinense. Até lá.
NOTAS:
1 – Microfilme 1.252.363 Barbacena, Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, item 02 bat fls 112-v
2 – Centro de Memória do Seminário Santo Antonio em Juiz de Fora, MG, lv bat 1772-1750 fls 120
3 – SETTE, Bartyra e JUNQUEIRA, Regina Moraes, Projeto Compartilhar (http://www.projetocompartilhar.org/), Inventários de Manoel Martins Gomes e Maria de Siqueira Paes, acesso 26 jun. 2009
4 – ASSIS, João Paulo Ferreira de. Polis 30 Um resgate da história dos municípios. Ressaquinha: s.n., 1998-2003, nr 41 fls 20
5 – Igreja N. S. da Piedade, Barbacena, MG, lv cas 1808-1826 fls 43 verso
6 – Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114, Registro de Terras de Leopoldina, nr 15
7 – idem, nr 16
Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA
Publicado no jornal Leopoldinense de 16 de maio de 2016
RECONTOS DE UM RECANTO – 02 – Artigo de José Luiz Machado Rodrigues e Nilza Cantoni publicado na Gazeta de Leopoldina.
Para este artigo de hoje nos valemos, do “Mapa da Capitania de Minas Geraes, com a deviza de suas comarcas”, José Joaquim da Rocha, concluído em 1778; do “Mapa da Província de Minas Gerais,” de 1855, de Friedrich Wagner que, provavelmente, incorporou os levantamentos de João José da Silva Theodoro para as Cartas do Presídio, de São João Nepomuceno e do Pomba; dos Relatórios da Presidência da Província do período entre 1836 e 1855; e, das publicações do Centro de Estudos Históricos e Culturais da Fundação João Pinheiro – Coleção Mineiriana, principalmente os títulos: Geografia Histórica da Capitania de Minas Gerais e a Província Brasileira de Minas Gerais publicada em 1998 e que traz o artigo de Johann Jakob von Tschudi de 1862 que acompanhou o Mapa de 1855.
A terra mineira, na época da viagem de Tschudi, estava dividida em 18 comarcas. Destas, destacaremos duas, a do Paraibuna e a do Muriaé, que são as mais próximas a Leopoldina.
A primeira delas, a do Paraibuna, contava cerca de 58.500 habitantes e abrangia:
– Barbacena, composta pela sede de mesmo nome e pelas freguesias de Santa Rita de Ibitipoca e de Nossa Senhora da Conceição de Ibitipoca. – Rio Preto, com seus 7 mil habitantes distribuídos entre a Vila de Nossa Senhora dos Passos do Rio Preto e a Freguesia de São José do Rio Preto. – Paraibuna, atual cidade de Juiz de Fora, com cerca de 13 mil habitantes, que incluía as freguesias de Simão Pereira e Engenho do Mato.
Dessa comarca vieram muitos do povoadores do Feijão Cru.
A segunda comarca que nos interessa é a que levava o nome de seu mais importante rio: o Muriaé.
Com 88 mil habitantes distribuídos em 4 municípios (Leopoldina – 23.000 habitantes, Mar de Espanha – 19.000,Ubá – 32.000 e Muriaé – 14.000), não mereceu de Tschudi as referências adequadas provavelmente por falta de conhecimento de seus informantes da “extraordinária expansão do povoamento” da região, em razão do plantio de café e toda a Zona da Mata. Embora se deva ressaltar que em 1856, por ocasião da aplicação da chamada Lei de Terras (Lei nr.601 de 18.03.1850), o café ainda não aparecia como principal produto de nossa economia. Entre os proprietários de terras da região somente 15% declararam possuir plantações de café. Cerca de 65% mencionaram “planta de milho” e os demais não indicaram o produto de suas roças.
O primeiro município dessa comarca, Leopoldina, abrangia a Vila Leopoldina (3.000 habitantes) e as Freguesias de São José do Paraíba (3.000) e de Santa Rita do Meia Pataca (3.000, incluindo-se aí toda a povoação da margem esquerda do Pomba), além dos Curatos de Conceição da Boa Vista, Nossa Senhora da Piedade, Bom Jesus do Rio Pardo e Madre de Deus do Angu (que somavam 14.000).
O segundo município, Mar de Espanha, que incluía a Vila, a Freguesia do Rio Novo e também os Curatos do Aventureiro e do Espírito Santo do Mar de Espanha.
Ubá aparece como terceiro município dessa comarca e era composto pela Vila e as Freguesias de São João Batista do Presídio, Santa Rita do Turvo e São Sebastião dos Aflitos.
O quarto município da Comarca é o que leva o nome do rio e que só seria elevado à categoria de “cidade” em 1865 como São Paulo do Muriaé. Dele faziam parte a sede e as Freguesias de Nossa Senhora do Glória e Nossa Senhora da Conceição dos Tombos.
Para finalizar transcrevemos o parágrafo de encerramento do artigo de Tschudi, com a tradução que encontramos na obra citada:
“Resta-me apenas acrescentar algumas palavras sobre o mapa anexo. Ele é o resultado de longos anos de trabalho do engenheiro civil Sr. Heinrich Wilhelm Ferdinand Halfeld, de Juiz de Fora, e do geógrafo da província de Minas Gerais, Sr. Friedrich Wagner, que faleceu no ano passado em sua residência em Ouro Preto. Embora não satisfaça às exigências que se fazem a uma carta geográfica precisa, é, no entanto, a melhor disponível sobre a província de Minas Gerais, e até mesmo a melhor sobre qualquer das províncias do Império. O auxílio pecuniário que foi colocado à disposição dos engenheiros por parte do governo provincial foi insuficiente para cobrir as despesas de medição do território, que tem mais de 16 mil milhas quadradas, e que apresenta tantas dificuldades topográficas. Ainda assim, esse mapa será de grande importância e valia para a futura elaboração de uma carta apoiada em medições trigonométricas, pela qual, porém, teremos certamente de esperar ainda durante muitas décadas.”
Um personagem sempre recorrente na história de Minas, quiçá do Brasil, é o Tropeiro. Escolhemos a descrição de Saint-Hilaire por acreditarmos ser a mais abrangente.
Dá-se o nome de tropeiros aos homens que conduzem as caravanas de burros destinadas a empreender essas viagens e outras semelhantes. As tropas um pouco consideráveis são divididas em lotes de sete animais, e cada um é confiado à guarda de um negro ou mulato que, caminhando na retaguarda dos cargueiros de que está encarregado, os incita e dirige por meio de gritos ou por um assobio bastante brando. Costuma-se carregar cada besta com oito arrobas (cerca de 120 quilos), e para não ferí-los, iguala-se a carga com o maior cuidado. Cada caravana que chega a um rancho aí toma o seu lugar; os animais são logo descarregados; arruma-se as mercadorias com ordem; cada animal recebe sua ração de milho; levam-nos ao pasto; arranjam-se-lhes as albardas, e se desentortam os cravos destinados a ferrá-los. Enquanto isso o mais jovem da tropa vai buscar água e lenha, acende o fogo, arma em redor três bastões que se unem superiormente, amarra-os, e suspende um caldeirão na tripeça, onde põe a cozinhar o feijão preto destinado ao jantar do dia e ao almoço do seguinte. Os tropeiros das diversas caravanas se aproximam uns dos outros, põem-se a conversar, relatam suas viagens e aventuras amorosas, e, às vezes, um deles encanta o trabalho dos vizinhos tocando guitarra e cantando algumas dessas árias brasileiras que tem tanta graça e doçura. Tudo se passa com ordem; raramente discutem, e falam entre si com uma delicadeza desconhecida na Europa entre homens de classe inferior. No dia seguinte, levantam-se bem cedo; dão aos burros nova ração de milho. Deixando o rancho, saúdam os tropeiros que ainda aí ficam; fazem nova caminhada de três a quatro léguas, e chegam a outra estação pelas duas ou três horas da tarde.[1]
Auguste de Saint-Hilaire, cientista francês que viajou pelo interior do Brasil entre 1816 e 1822, deixou-nos preciosas informações sobre o Brasil do início do século XIX. Mário Guimarães Ferri, na introdução do “Segunda Viagem”, nos diz que “seus relatórios de viagens são um manancial riquíssimo de informações. … Sua obra é, com efeito, de valor perene e interessa ao botânico, ao zoólogo, ao geógrafo, ao historiador, ao etnógrafo; interessa, enfim, a todos quantos desejam conhecer algo sobre o Brasil do início do século XIX, de um Brasil que, em geral, já não mais existe.” [2]
Tropeiros na Serra dos Órgãos, por Rugendas, prancha 15 das paisagens em Viagem Pitoresca através do Brasil
De leitura agradabilíssima, os relatos de viagem de Saint-Hilaire nos trazem informações algumas vezes surpreendentes. Um exemplo é a forma como descreve a Inconfidência Mineira no volume dedicado à primeira viagem a Minas. Usando termos como “pretensa conspiração” ele nos indica que ao tempo de sua estada no Brasil o movimento dos mineiros não era visto com as cores negras como nos acostumamos a ler nos livros de história. Aliás, é ainda Saint-Hilaire quem escreve que o Visconde de Barbacena informou ao Vice-Rei, no Rio de Janeiro, sobre o movimento em Minas, pintando-o como “ato de rebelião mais criminoso e terrível” do que na verdade teria sido.
Na época de sua primeira viagem informa o cientista que o governo mineiro isentava por dez anos de impostos aos que se transferissem para as fronteiras da Província. Portanto, este viajante tem muito a nos dizer sobre as Minas daquele início de século, na época em que se intensificaram as migrações em demanda da região hoje conhecida como zona da mata mineira.
Um outro personagem importante para o estudo de nossa região e também mencionado por aquele viajante é o guarda-mor. Algumas vezes temos visto sucederem-se informações sobre dois ou mais personagens, contemporâneos e vivendo na mesma região, a quem um mesmo autor dá o título de Guarda-Mor das Minas e por essa razão tornam-se alvo de contestação de alguns menos estudiosos. Cargo criado em 1679, era inicialmente o administrador a quem competia, entre outras atividades, conceder licença a quem quisesse descobrir minas. Nomeado pelo Administrador Geral ou Provedor das Minas, a este substituía em algumas das inúmeras atividades que lhe eram afetas, especialmente com a intensificação das pesquisas mineirais em terras do Brasil. Ao tempo de sua primeira viagem a Minas, assim se manifestou Saint-Hilaire;
O cargo de guarda-mor geral é hereditário na família de um rico cidadão da Província de São Paulo que mandou abrir à sua custa o caminho do Rio de Janeiro a Vila Rica.
O guarda-mor geral tem o direito privativo de conceder o título de mineração; como, porém, não habita ordinariamente a Província das Minas, seu cargo de reduz a um título, e os guardas-mores substitutos preenchem suas funções. Quando o guarda-mor geral se encontra na capitania, é ele quem nomeia os substitutos; em sua ausência esse direito pertence ao governador. De poucos anos para cá multiplicaram-se extraordinariamente os guarda-mores substitutos, que, na linguagem corrente, se designam simplesmente pelo nome de guarda-mores.[3]
Esclarecemos que o Guarda-Mor Geral citado por Saint-Hilaire era Garcia Rodrigues Paes, filho de Fernão Dias Paes Leme, sobre os quais o viajante inseriu nota no rodapé do texto acima.
A Segunda Viagem de Saint-Hilaire começou a 29 de janeiro de 1822, no Rio de Janeiro. No dia 6 de fevereiro ele entrou em território mineiro. Eis parte de seu relato do dia:
Serve o Rio Preto de fronteira às capitanias do Rio de Janeiro e Minas.
À extremidade de uma ponte fica uma cidadezinha encostada à montanha, composta de uma única rua muito larga e paralela ao rio. Tem a cidade o mesmo nome do rio; depende do distrito de Ibitipoca e só conta uma igreja não colada, servida por um capelão.
As casas de Rio Preto, excetuando-se uma ou duas, são térreas, pequenas, mas possuem um jardinzinho plantado de bananeiras, cuja pitoresca folhagem contribui para o embelezamento da paisagem. [4]
Seis dias depois o cientista estava acomodado em uma granja no “Rancho de Manoel Vieira” e seu relato volta a mencionar características da paisagem. Já tendo passado pela “Serra Negra”, informa que todo o percurso é um subir e descer muito cansativo. Sobre o Rio do Peixe que atravessara “um quarto de légua” antes, diz apenas; “passamos, sobre uma ponte de madeira, o pequeno rio chamado Rio do Peixe e pelo percurso vimos várias fazendas”.
Já no relato de sua primeira viagem o cientista declarou-se impressionado com o que chamou de “misto de desordem e regularidade selvagem”, chamando a atenção sobre as montanhas que se misturam no horizonte e fazem pensar que o rio nasce na elevação posterior à que primeiro se avizinha quando, ao passar posteriormente por ela, constatou que as águas vinham de um ponto bem mais distante. Século e meio depois o grande poeta Carlos Drumond de Andrade nos brindou com suas fortes impressões das montanhas de Minas.
Mais 3 dias da segunda viagem e no dia 15 de fevereiro de 1822 o relato de Saint-Hilaire nos traz informações sobre o acidente geográfico que foi determinante na escolha do local de fixação dos antigos moradores da região – a Serra da Ibitipoca.
A Serra da Ibitipoca não é pico isolado e sim contraforte proeminente de cadeia que atravessei desde o Rio de Janeiro até aqui. Pode ter uma légua de comprimento e apresenta partes mais elevadas, outras menos, vales, penedos, picos e pequenas partes planas. As encostas são raramente muito íngremes. Os pontos altos representam, geralmente, cumes arredondados e os rochedos mostram-se bastante raros. O fundo e barrocas estão geralmente cobertos de arbustos, mas poucos capões se vêem de mato encorpado. Quase toda a montanha está coberta de pastos, sempre excelentes.[5]
No dia 16 de fevereiro de 1822 é a vez de citar a Vila de Ibitipoca que ele mal conhecera na viagem anterior e por isso julgava ser “mais insignificante”.
Fica situada numa colina e se compõe de pequena igreja e meia dúzia de casas que a rodeiam, cuja maioria está abandonada, além de algumas outras, igualmente miseráveis, construídas na encosta de outra colina. Não espanta, pois, que inutilmente haja eu procurado, ontem, nesta pobre aldeia, os gêneros mais necessários à vida. [6]
Nesta ocasião Saint-Hilaire faz comentários sobre o interior de uma casa de fazenda que é semelhante a outras que ele conhecera no Brasil. Informa que na sala existe uma única mesa e um banco e nos quartos as camas são simples armações de madeira. A parada seguinte é Santa Rita de Ibitipoca, mencionada no diário de 17 de fevereiro.
Esta aldeia, situada em agradável posição, na encosta de uma colina, não é senão uma sucursal de Ibitipoca, embora importante. Compõe-se de uma única rua, mas ali se vêem algumas bonitas lojas.[7]
No dia seguinte Saint-Hilaire escreve da Fazenda da Cachoeira, onde pousou após o percurso de 5 léguas desde Santa Rita de Ibitipoca. Esta Fazenda é ponto de análise para quantos se dediquem ao estudo dos povoadores da zona da mata mineira. Mencionada por muitos como tendo sido propriedade desta ou daquela família, acreditamos que no início do século dezenove o nome Fazenda da Cachoeira compreendia inúmeras pequenas propriedades, talvez desmembramentos de uma grande fazenda formada no século anterior. Saint-Hilaire não indica o nome do proprietário, apenas informa que estava em viagem para “buscar algodão no Araxá para levar ao Rio de Janeiro”.
Aqui trouxemos recortes de como foram vistos por Saint-Hilaire as terras onde viviam os povoadores dos Sertões do Leste. Antes de prosseguirmos, transcrevemos mais um trecho da primeira viagem.
O primeiro lugar habitado que se encontra depois do Paraibuna é Rocinha da Negra, onde se vê um rancho e uma venda construídas em um vale à margem de um regato. Pouco mais longe, passa-se diante de uma choça denominada Três Irmãos, e em breve se chega à povoação de Vargem, localizada em um amplo vale rodeado de morros. O nome Vargem, sinônimo da palavra portuguesa várzea, se aplica geralmente a essas espécies de planícies úmidas e rodeadas de elevações que são bastante comuns nas partes montanhosas do Brasil, e diferem um pouco do resto do país pela vegetação.[8]
Em nota do próprio autor ao texto acima ficamos sabendo que ele foi recebido de maneira muito cordial em Vargem e que por isso faz questão de denunciar um outro viajante estrangeiro que teria sido tão bem recebido quanto ele e que, no entanto, depois teria “vilipendiado” o hospedeiro.
Encerramos este capítulo que pretendemos seja esclarecedor quanto à anterior localização dos povoadores de São Sebastião do Feijão Cru, de Bom Jesus do Rio Pardo, de São José do Paraíba, de Madre de Deus do Angu e de Nossa Senhora da Piedade. Localidades que nasceram no alvorecer do século dezenove nas antigas “áreas proibidas” da terra mineira.
1 - SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1975. p. 41
2 - SAINT-HILAIRE, Auguste de. Segunda Viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo. Belo Horizonte: Itatiaia, 1974. p. 7
3 - Viagem pelas Províncias...(idem nota 1), p. 110
4 - Segunda Viagem...(idem nota 2), p. 24
5 - idem, p. 33
6 - idem, p. 35
7 - idem, p. 36
8 - Viagem pelas Províncias...(idem nota 1), p. 49