Paleografia e dificuldades da leitura documental

Paleografia na Pesquisa Histórica foi a comunicação de Jairo Braga Machado sobre Leitura Documental, realizada no dia 29 de junho de 2012 em Conselheiro Lafaiete, por ocasião do 3º Encontro de Pesquisadores do Caminho Novo. Transcrição: Nilza Cantoni. Revisão: Joana Capella.

Memória e identidade regional: historiografia, arquivos e museus em Minas Gerais

Artigo de Álvaro de Araujo Antunes e Marco Antonio Silveira

Resumo
O presente artigo tem por objetivo analisar algumas das relações estabelecidas entre a produção historiográfica, as práticas de pesquisa e as instituições museológicas tomando como referência o caso de Minas Gerais na primeira metade do século XX. Para isso, são recuperados aspectos concernentes ao debate historiográfico do período e à criação de instituições como o Arquivo Público Mineiro (1895) e o Museu da Inconfidência (1944). Por fim, são propostas algumas considerações sobre a constituição da memória nos dias de hoje.

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Preservação e Difusão de Acervos Patrimoniais

Terminou hoje o Seminário Nacional de Digitalização e Difusão de Acervos Patrimoniais, promovido pelo Museu Imperial. Brevemente as palestras estarão disponíveis no site, na seção dedicada ao Projeto DAMI – Digitalização do Acervo do Museu Imperial.

A penúltima palestra foi do Professor Doutor Pedro Puntoni, Diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin – Brasiliana USP. Discorreu sobre o processo de constituição desta biblioteca digital e ressaltou a necessidade de envolvimento da sociedade, lembrando que a digitalização “não só evita o estresse causado pelo manuseio do original como permite a ampliação do acesso que vai garantir que o acervo seja preservado”. Isto porque, se a sociedade em geral não tem acesso, desconhece o acervo e não luta pela sua preservação. “Se eu guardar um tesouro e ninguém puder vê-lo, a próxima geração não saberá que ele existe”, disse Pedro Puntoni.

Precisamos refletir sobre a mudança de paradigma relativo à preservação dos acervos que estão sob a guarda dos nossos museus, arquivos e bibliotecas. Envolvendo a sociedade, os gestores serão chamados a responder aos seus anseios, no sentido de preservar estes bens culturais. Mas a sociedade só pode lutar por aquilo que conhece. A digitalização é a melhor maneira de ampliar o conhecimento geral sobre a memória cultural que se encontra sob a guarda das instituições encarregadas de sua preservação.

Proposta de Integração dos Arquivos Regionais

O segundo dia do Encontro de Pesquisadores do Caminho Novo começou com a palestra de José Guilherme Ribeiro, que abordou os padrões existentes para a implantação de uma rede de arquivos e os modelos de funcionamento do Arquivo Online da Califórnia (EUA) e do Portal Português de Arquivos. Informou que o projeto já foi iniciado com duas instituições de Juiz de Fora.
A padronização é essencial para a formação da rede, permitindo a migração das descrições para a internet e o acesso por diferentes meios. Entretanto, a padronização dos arquivos é relativamente tardia se comparada, por exemplo, ao que ocorreu na Biblioteconomia, cujo estabelecimento de normas de descrição e codificação vem de longa data. Na Arquivologia isto começa por volta de 1980 e vai resultar na criação da ISAD (G) – Norma Internacional de Descrição Arquivística, em 1994. Este instrumento fixa as normas como devem ser feitas as descrições e,consequentemente, a criação dos instrumentos de pesquisa em arquivos. Em 2006 é adaptada para a realidade brasileira, surgindo então a NOBRADE – Norma Brasileira de Descrição Arquivísitica.
A NOBRADE fixa um certo número de elementos para a descrição de qualquer unidade de um acervo arquivístico, como título, data, conteúdo e outros que vão constituir a referência das unidades. Dentro do conjunto de elementos, destaca o número mínimo de elementos e normatiza a possibilidade de acréscimo de novos elementos. Além disto, fixa a estrutura hierárquica para os elementos, já que os níveis de descrição arquivística são vistos como uma hierarquia. Por exemplo: o Fundo contém Séries, que por sua vez contém Subséries, as quais contêm itens e assim por diante. Desta forma os elementos ficam organizados numa árvore de hierarquia estruturada.
Como exemplo da aplicação da norma, o palestrante mostrou duas descrições e explicou os elementos ali presentes. Ressaltou que tanto a NOBRADE como a ISAD não determinam o modo de veiculação das informações, permitindo que o conjunto possa ser utilizado em formato texto, planilha ou html.
Um dos formatos é sugerido pela EAD- Encoded Archival Description (descrição arquivística codificada), escrevendo as descrições em linguagem xml para divulgação na rede mundial de computadores. Resultado de um projeto iniciado nos Estados Unidos no início dos anos de 1990 que não tinha por objetivo padronizar a descrição arquivística, mas investigar diversas modalidades possíveis de construir um instrumento para descrições em formato digital. Foi iniciado na época da ISAD (G), razão pela qual pretendia ser compatível com ela.  Tem se firmado como padrão internacional, utilizado especialmente no intercâmbio de descrições arquivísticas.
Todos estes sistemas trazem conceitos importantes, disse José Guilherme. O primeiro deles é que a padronização e a criação de instrumentos de pesquisa modelares facilitam ao usuário final um aprendizado natural do método, permitindo-lhe melhor explorar os acervos. Além disso, a padronização facilita a manipulação dos instrumentos pelos recursos digitais. Outro aspecto beneficiado é a troca de informações,permitindo a formação de bancos de dados unificados. No que se refere à construção de redes, a padronização permite que cada instituição mantenha sua autonomia ao mesmo tempo em que compartilha as descrições, não sendo necessário que o órgão centralizador altere o formato de localização das unidades arquivísticas em cada arquivo participante da rede.
A seguir o palestrante discorreu sobre o Arquivo Online da Califórnia, que reúne mais de duzentas instituições. Vinculado ao projeto EAD, permite acesso às descrições e às imagens digitais dos documentos. Reúne bibliotecas e museus públicos e de universidades. Seu modelo é o de banco de dados centralizado, ou seja, todas as instituições participantes do projeto permitem o acesso on line às descrições através do Arquivo Online da Califórnia.
Foi projetada a imagem do site do Arquivo Online da Califórnia através da qual José Guilherme explicou as possibilidades de uso de cada seção ali disponível. Declarou que é um modelo simples, que cresceu ao longo do tempo, pela agregação de novas instituições e dos novos padrões que foram sendo normatizados.
O palestrante ressaltou que os arquivos on line utilizam as convenções de uso da EAD na rede internacional de computadores, aproximando os acervos dos interessados.
Em seguida apresentou o Portal Português de Arquivos que atualmente reúne cerca de vinte instituições portuguesas. Faz parte da Rede Portuguesa de Arquivos que pretende reunir todas as instituições da Comunidade de Língua Portuguesa. O Portal utiliza a EAD em conjunto com a ISAD (G). Foi explicado que o modelo utilizado baseia-se na exportação de dados de cada instituição para o Portal de modo que, quando o internauta faz a opção por ver detalhes de um determinado documento, terá acesso a outra página do próprio portal. Caso a escolha seja por ver o registro original, o consulente será direcionado para o site da instituição original.
Concluindo, José Guilherme declarou que a maior dificuldade da constituição de uma rede de arquivos não é a solução técnica, mas fazer com que as instituições dialoguem e trabalhem em parceria, saindo do isolamento e agindo coletivamente. Este é o passo fundamental porque não basta adotar uma norma, mas trocar informações. As normas permitem diversas interpretações, sendo necessário promover adaptações que serão melhor implementadas se realizadas em parceria.
Declarou que é preciso buscar um modelo simples e, ao mesmo tempo, adequado às necessidades dos integrantes. Não é necessário trazer modelos de fora, mas adaptar à realidade local. É preciso começar com um projeto pequeno que possa crescer e criar raízes, ampliando o número de participantes.

Voluntariado como alternativa

Recente notícia da Agência Ecclesia de Portugal, sobre a atuação de voluntários, poderia ser seguida por tantas instituições brasileiras que alegam falta de pessoal para colocar acervos à disposição do público.
“O arquivo histórico e documental do Patriarcado de Lisboa está a ganhar vida nova, graças a uma vaga de voluntariado cultural que reúne recursos humanos das mais diversas áreas de actuação.”
Vejam matéria completa:

Descaso com Material Arquivístico em Leopoldina

Os livros de assentos paroquiais faziam parte da burocracia administrativa ao tempo em que Leopoldina foi elevada a município. Assim é que, no primeiro dia útil após a instalação, foram abertos os livros de casamentos, nascimentos e óbitos. Entretanto, por incúria administrativa, os originais não foram preservados. Só foi possível reconstruir alguns fatos através da interpretação de outras fontes.

Analisando transcrições feitas no início do século XX, pelo então vigário Aristides de Araújo Porto, verificamos que os primeiros livros foram abertos no dia 21 de janeiro de 1855, justamente o primeiro dia útil de funcionamento da administração municipal. Um único original desta época foi encontrado: o livro de assentos matrimoniais de escravos. Ainda assim, embora em outras fontes seja possível verificar que vários escravos se casaram nos anos de 1855 e 1858, o primeiro assento ainda existente é o registrado na página 10 daquele livro, datado de 28 de agosto de 1861, relativo ao casamento dos escravos Agostinho e Tereza, pertencentes Vicente Ferreira Monteiro de Barros. Curiosamente o Termo de Abertura encontra-se no verso desta folha com a data 21 de janeiro de 1857.

Não foi possível identificar os motivos que levaram ao lançamento do Termo de Abertura no verso da décima folha do livro. Ficou bem claro que o livro já estava em uso porque no anverso constam dois registros de casamentos realizados nos dias 28 de agosto e 10 de setembro de 1861 e o próprio termo está no meio de outro assento. Além disso, o ano 1857 diverge das declarações do padre Aristides, apostas na contra capa do livro em que transcreveu casamentos realizados a partir de maio de 1877. Acrescente-se a informação de que escravos de Manoel Antonio de Almeida casaram-se em 1855, conforme assento transcrito desordenamente em outro livro paroquial, conclui-se que os livros realmente foram abertos tão logo iniciou-se a administração municipal de Leopoldina.
Ao fazer este registro, a intenção é chamar a atenção para uma ocorrência que remonta a meados do século XIX e que se repete até os dias atuais em Leopoldina. Apesar de normativos legais exarados pelo governo de Minas Gerais, bem como por órgãos da administração federal, as fontes documentais em Leopoldina continuam sendo tratadas com descaso, ou melhor, não são tratadas.

Histórica: Revista On Line do Arquivo Público do Estado de São Paulo

Já está disponível a edição de nº 45 desta excelente publicação. Difícil destacar qual a melhor matéria.
De Mônica Karaweczyk – Uma paulista na luta pela cidadania política: Diva Nazário e sua tentativa de alistamento em 1922.
De Maria de Fátima A. di Gregorio – Mulheres, Corpos e Pecados: uma discussão sobre a questão da condição feminina no Brasil Colônia.

Os pesquisadores e os arquivos

Todos nós, pesquisadores não profissionalizados, já nos deparamos com situações inadequadas quando visitamos alguns centros de documentação. Seja o arquivo de uma Câmara Municipal, um Arquivo Paroquial ou acervos particulares, não é raro encontrarmos pessoas responsáveis pela guarda e manuseio que demonstram falta de preparo para a função. Não nos cabe discutir as causas. Entretanto, cada um de nós pode contribuir, no mínimo, para a reflexão daqueles que nos atendem nestes locais.
Quantas vezes você, que lê esta postagem, já encontrou documentos municipais empilhados num porão? E por acaso já foi atendido por uma pessoa que molhava os dedos na língua para folhear um raro livro do Cartório de Notas? Ou encontrou Atas de uma Irmandade do século XVII  ‘remendadas’ com fita adesiva?
Se já passou por isso, teve oportunidade de conversar com quem lhe atendia? Por acaso descobriu que documentos fundamentais para a sua pesquisa estavam sob os cuidados de pessoas simples, que ali cumpriam a jornada de trabalho com dedicação mas sem nenhum conhecimento sobre a melhor forma de tratar o acervo?
Se você já teve tal tipo de experiência, está convidado a pensar no que cada um de nós pode fazer para mudar este estado das coisas. Que tal seguir, por exemplo, o twitter do Arquivo do Estado de São Paulo e retuitar as dicas que eles publicam? Se você ajudar a disseminar as informações, muitas outras pessoas poderão se interessar pelo assunto e o conhecimento chegará não só aos abnegados que trabalham em arquivos esquecidos pelo poder público, mas também aos que podem efetivamente promover a mudança.

Arquivos Públicos Regionais

 

Este momento do Encontro de Pesquisadores de História e Geografia do Caminho Novo da Estrada Real contou com a participação de representantes das seguintes instituições: 1 – Arquivo Público Municipal de Ouro Preto – APMOP, com João Paulo Martins;

2 – Escritório Técnino do IPHAN de São João del Rei, com Jairo Machado;

3 – Arquivo Histórico da Universidade Federal de Juiz de Fora – AHJF, com Galba di Mambro;

4 – Arquivo Público Municipal de Santos Dumont – APMSD, com Marisa Fontes;

5 – Arquivo Públimo Municipal de Barbacena – APMB, com Edna Resende.

Não só através das comunicações dos responsáveis, mas também por conversas que fluíram durante todo o dia, chama a atenção a necessidade de atuação de associações de amigos dos arquivos públicos para buscar alternativas diversas. Isto porque, no âmbito de sua atuação, nem sempre os diretores ou responsáveis conseguem equipamentos, melhorias, estagiários e um sem número de providências necessárias.

1 – APMOP

João Paulo Martins informou que o acervo abrange o período 1728 a 1931, com volume maior para o século XIX. É composto por documentação produzida pela Câmara e pela Prefeitura. Em sua breve apresentação, mencionou curiosidades. Uma delas: as pontes existentes entre Ouro Preto e Barbacena não são antigas como normalmente se divulga, mas construídas no século XIX.

2 – IPHAN

Este arquivo conta com material produzido a partir de 1711. “O cidadão tem direito a sua memória, a suas raízes, a dialogar com seus antepassados”, disse Jairo Machado. Falou sobre a mudança da instituição que antes utilizava um pequeno espaço dentro do Museu Regional de São João del Rei e agora conta com sede própria. E ressaltou que ‘obrigatoriamente a história de Minas Gerais passa por São João del Rei’, a principal vila abastecedora da Corte do Rio de Janeiro.

Além de informar que o Escritório Técnico do IPHAN conta com uma Biblioteca de mais de mil volumes, Machado fez diversas considerações sobre a função do arquivo e encerrou afirmando: ‘o mais importante: é um arquivo público’.

3 – AHJF

O professor Galba di Mambro denominou sua apresentação como ‘Arquivo Hisórico da UFJF: perspectivas de pesquisa sobre o Caminho Novo’. Destacou que o acervo relativo ao tema é pequeno, só um fundo que, entretanto, conta com 30.000 processos de 1830 a 1960, provenientes do Forum Benjamin Colucci.

Um dos destaques da apresentação, além do roteiro didaticamente apresentado em slides, foi a explicação de que a instituição não é o Arquivo Permanente da Universidade, mas um Centro de Memória Social. Informou que está sendo providenciada a mudança do nome para melhor identificá-lo dentro do Sistema de Arquivos da UFJF.
Site do Arquivo

4 – APMSD

Marisa Fontes lembrou que um dos organizadores do Encontro, Luiz Mauro Andrade da Fonseca, é um dos fundadores do arquivo e incentivador de seu trabalho na instituição. ‘A sensibilidade de guardar a memória da cidade’, disse Fontes, nasceu pelas mãos de vários entusiastas. Destacou, entre outros, Oswaldo Castelo Branco, historiador e um dos fundadores da Casa de Cabangu, e o grupo Pesquisadores Independentes do qual Luiz Mauro faz parte.

Na direção desde 1997, Marisa Fontes mostrou-se uma entusiasta da preservação da memória local que muitas vezes sofre concorrência da imagem popular que liga o município exclusivamente ao aviador Alberto Santos Dumont. Entretanto, trata-se de um município importante para a história da Estrada Real, da Ferrovia e da indústria de laticínios, entre outras.

Descreveu ligeiramente o acervo que hoje se encontra no antigo prédio da Estação Ferroviária e informou que, além de subsidiar projetos de Educação Patrimonial, o arquivo municipal preocupa-se não só com o armazenamento mas com catalogação, microfilmagem e digitalização do acervo. Divulgar, é a chave de sua atuação, disse Fontes. ‘As crianças se encantam’, complementou, especialmente com o que se refere à ferrovia que é a alma do município.

Em seguida, Luiz Mauro Andrade da Fonseca comentou que a obra de Alberto Santos Dumont é sobejamente estudada e conhecida e que a cidade tem outros focos, como a industrialização. ‘A coisa ruim das nossas cidades’, disse Fonseca, é que as escolas continuam estudando Inconfidência Mineira, Tiradentes e Aleijadinho e não incluem a história local em seus programas de ensino.

5 – APMB

Edna Resende informou que as atividades do Arquivo foram iniciadas há 10 anos, ‘quando a documentação do Poder Judiciário estava prestes a ser eliminada’ e a inauguração ocorreu em agosto de 2005. Foram apresentadas imagens do acervo, antes e depois do tratamento arquivístico.

Posteriormente foram recolhidos outros conjuntos, com destaque para o arquivo do Professor Altair Savassi com um rico material sobre a história regional, incluindo publicações periódicas. Além de obras dos memorialistas, os pesquisadores encontram na instituição fontes como inventários, testamentos, processos criminais, sesmarias, material sobre escravidão, escrituras e outros. Edna Resende informou que há cartas de sesmarias, provindas da coleção da família Andrada, diferentes das encontráveis no Arquivo Público Mineiro.

‘Era difícil fazer pesquisa sobre Barbacena porque não havia fontes disponíveis’, lembrou Resende, situação que agora se modificou e já apresenta resultados em pesquisas universitárias ou não. Ressaltou, ainda, que a criação da Associação Cultural do Arquivo Histórico Municipal Professor Altair José Savassi trouxe novo estímulo, já que o grupo tem sido responsável por buscar outros caminhos para o funcionamento da instituição.

Ao final da mesa redonda alguns ouvintes declararam não saber, até aquele momento, da existência de tal diversidade de fontes disponíveis para o estudo não só do Caminho Novo como, especialmente, da história dos municípios surgidos a partir dele.