130 – Primeiros impactos: a chegada do Trem e o desenvolvimento

O Trem de História hoje vai falar do Trem real e dos impactos provocados com a sua chegada.

É evidente que o braço escravo contribuiu muito para o desenvolvimento das fazendas da região. Mas é certo, também, que na década de 1870 começaram a ocorrer modificações estruturais importantes no processo de urbanização da região, desencadeadas com a abertura da Estrada de Ferro Leopoldina.

Segundo o Recenseamento de 1872[1], no município de Leopoldina, que na época incluía Angustura e os atuais municípios de Argirita, Cataguases, Laranjal, Miraí, Pirapetinga e Recreio, existiam 4.853 propriedades rurais com uma população total de 46.900 pessoas. Entre as freguesias que compunham o município, São Sebastião da Leopoldina tinha a maior área territorial, a maior população e fontes[2] de 1856 mostram que era também onde se encontrava o maior número de grandes propriedades.

É bom lembrar que os trilhos da Estrada de Ferro começaram a chegar pelas estações ferroviárias de Porto Novo (Além Paraíba), Pântano (depois Antônio Carlos e atual Fernando Lobo), Volta Grande, São Luiz (Trimonte) e Providência, em 1874; São Martinho, em 1875; Santa Isabel (Abaíba), Recreio e Campo Limpo (Ribeiro Junqueira), em 1876; Vista Alegre, Leopoldina e Cataguases, em 1877; São Joaquim (Angaturama), Aliança (Cisneiros) e Palma, em 1883; Banco Verde, em 1884; e, Morro Alto (Barão de Monte Alto), em 1885. E foi a partir daí que chegaram a essas comunidades urbanas os serviços de água encanada, esgoto e energia elétrica, o que provocou grandes mudanças.

Com o trem começou, também, a chegar a nova força de trabalho, representada pelos imigrantes, o que modificou profundamente a economia local. No início, através do sistema de colonato implantado nas fazendas, com a circulação de mercadorias ainda sob o poder dos mesmos comerciantes do período escravista que logo tiveram que mudar de postura, forçados pela demanda do imigrante que chegara com outros valores e outra socialização.

A partir de então, não era mais somente o feitor que se dirigia ao ponto de venda em busca dos suprimentos que mantivessem em funcionamento a fazenda. Com trabalhadores remunerados, os fazendeiros não podiam mais determinar a aquisição de certos produtos de fornecedores previamente acordados, porque o imigrante passou a decidir onde e quando comprar. E em sua ânsia de fare l’America, impunha todo tipo de sacrifício para sua família, tendo por catecismo a necessidade de poupar sempre. E se o preço cobrado ou as condições do negócio lhe pareciam inadequadas, era o imigrante que decretava o fim do consumo daquele produto, o que obrigava o comerciante e rever seus conceitos.

Outra novidade que trouxe grande contribuição para a rápida mudança do panorama foi o sistema de contratação. Os trabalhadores realizavam um sem número de tarefas extras, sempre remuneradas à parte. Por vezes o chefe da família imigrante alugava sua própria força de trabalho para atividades extraordinárias como a derrubada da mata, o fabrico de móveis ou a construção de casas, enquanto a esposa e os filhos cuidavam da manutenção das “ruas de café” pelas quais assumira compromisso com o proprietário da fazenda.

Além disto, ao ser contratado o colono passava a ter direito a um pedaço de terra onde podia plantar os víveres de que necessitasse, o que possibilitava vender o excedente.

A forma de encarar o trabalho e a ferrenha vontade de vencer do imigrante modificaram substancialmente a economia do município. Mudanças com reflexos evidentes, principalmente no modo de produção e nas relações de trabalho e consumo que resultaram, nos anos seguintes, em profunda alteração na vida sócio-econômica de Leopoldina e, acredita-se, de todas as cidades que receberam grande número de trabalhadores livres naqueles últimos anos do século XIX.

No final dos oitocentos, em Leopoldina alguns imigrantes já não trabalhavam em propriedades particulares, mas numa colônia organizada pela Câmara Municipal[3]. Se no início eram colonos lavradores, logo passaram a atuar como pequenos artesãos e comerciantes de verduras, legumes e frutas. A consequência desta modificação no sistema de produção parece ter se refletido na cidade, abrindo novos mercados de trabalho e oportunidades para o estabelecimento de uma relação de emprego e renda que influenciou diretamente a economia local.

Não são poucas as obras que abordam o crescimento das periferias, promovido pela migração interna conhecida como êxodo rural. A família que deixa a área rural vai residir em áreas no entorno do núcleo do povoado e passa a atender às necessidades dos moradores locais, exercendo atividades tão variadas quanto a construção de pequenos artefatos em madeira, o plantio e venda de frutas e verduras, atividades da construção civil etc.

Tais práticas indicam a junção de vários fatores que promoveram, no caso de Leopoldina, o crescimento de áreas como o bairro Ventania ou, Quinta Residência, que surgiu às margens do antigo leito da Rio-Bahia, desenvolveu-se com a instalação da Residência do DER-MG e transformou-se num bairro bastante populoso, embora antes mesmo da abertura da antiga rodovia ali já estivessem residindo diversas famílias de imigrantes.

A história não para, mas o Trem precisa fazer uma pausa. Ele volta com nova carga no próximo número do Jornal. Aguardem!


Fontes de referência:

1 – Recenseamento do Brasil em 1872. Segunda Parte: Província de Minas Gerais. Publicação do Serviço Nacional de Estatística.

2 – Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, Registros de Terras TP 97, 114, 120, 121, 151 e  155 ; Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro,  Registro de Terras da Paróquia de Santo Antônio de Pádua.

3 – Os livros contábeis da Câmara Municipal de Leopoldina, relativos ao último decênio do século XIX, registram pagamentos de víveres e objetos adquiridos de imigrantes da Colônia Santo Antônio.

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA

Publicado na edição 383 no jornal Leopoldinense de 28 de junho de 2019

 

150 anos de nascimento de João Caetano Bittencourt

No início do século XIX, na região de Mercês do Pomba, vivia um açoriano de nome João Caetano Bittencourt que viera da Ilha Terceira em 1772. Um de seus filhos teria sido o avô paterno do homônimo que nasceu em Leopoldina no dia 16 de julho de 1867: João Caetano Bittencourt era filho de outro do mesmo nome e de Rosalina Luiza do Carmo, referida em algumas fontes como  Rosaline Louise do Espírito Santo.

Por ocasião da Exposição Regional de 1897, em Leopoldina, foi aberto um livro de Inscrições dos Expositores onde encontramos o registro de João Bittencourt Filho que iria expor Chapéus de Cipó e Tinta Vegetal. Segundo informações orais, trata-se do marido de Rosalina que vivera em Leopoldina até 1871, passara pouco mais de dois anos em Mercês do Pomba e em 1873 voltara para Leopoldina. De fato, o filho mais novo do casal declarou, ao casar-se, que nascera em Mercês do Pomba. Os demais foram batizados em Leopoldina.

O João Caetano nascido em 1867 era carpinteiro e residia no terceiro quarteirão de Leopoldina quando foi feito seu alistamento militar em 1890. Segundo a divisão implantada pelo subdelegado de polícia naquele ano, o terceiro quarteirão iniciava-se na “casa de Olívio de Vargas Corrêa, seguia pela Rua Primeiro de Março e subia até o alto da matriz”.  Esta rua então denominada Primeiro de Março abrangia as atuais ruas Gabriel Magalhães e Lucas Augusto e Olívio parece ser o filho de Custódio de Vargas Corrêa que tinha residência nas proximidades do cemitério atual.

Em 1899 João Caetano casou-se com Luiza Rodriguez Gonzalez, nascida em 1867 em El Rozal, Pontevedra, Espanha, filha de Manoel Rodriguez e Joana Gomes Gonzalez. O casal teve, pelo menos, os filhos Zulmira (1900), Belmira (1904), Helena (1905), Maria José (1907), João (1908) e Marciano Caetano Bittencourt.

Cataguases e seus distritos

Cataguases, no século XIX, quando era subordinada a Leopoldina.

Parte do estudo concluído em março de 2013 sobre as alterações de área territorial de Leopoldina, o mapa acima destaca distritos de Cataguases nos anos oitocentos, ao tempo em que eram subordinados a Leopoldina.