158 – Fazendas na área do atual distrito da Cidade

Nesta série de textos sobre os Pioneiros de Leopoldina, o Trem de História vem carregando seus vagões com o que conseguiu apurar sobre as mais antigas propriedades do município. Depois de abordar os antecedentes da ocupação do território, falar um pouco sobre as sesmarias, as unidades de medida e os instrumentos de demarcação das propriedades, foram trazidas informações sobre uma fazenda pouco conhecida, a Santana do Rio Pomba [S], em cujas terras foi construída a estação Vista Alegre da Estrada de Ferro Leopoldina, inaugurada em 1877. Estação que foi um marco importante na história de Leopoldina, já que o transporte ferroviário sustentou a economia e o desenvolvimento social do município por um longo período.

A partir de agora o espaço será preenchido por outras fazendas constituídas nos primeiros anos da ocupação da área do atual distrito da Cidade.

A análise das fontes documentais sobre as propriedades dos primeiros entrantes demonstrou que o pioneiro Joaquim Ferreira Brito se estabeleceu nas cachoeiras do Ribeirão do Feijão Cru [C]; Manoel Antônio de Almeida ficou com as terras margeadas pelo Feijão Cru Pequeno [FC]; João Gonçalves Neto [R] e João Gualberto Ferreira Brito [F] se tornaram vizinhos no terço inicial do Ribeirão Jacareacanga; Antônio Rodrigues Gomes [AV] ocupou terras banhadas pelo Córrego do Moinho e seu irmão Bento Rodrigues Gomes [CB] formou fazenda um pouco mais ao norte.

O esquema a seguir mostra a posição destas fazendas em relação aos cursos d’água mencionados.

Interessante observar as ligações de parentesco entre os seis pioneiros citados:

– Joaquim Ferreira Brito, formador da fazenda Cachoeira [C], era pai de João Gualberto Ferreira Brito [F] e sogro de Bento Rodrigues Gomes [CB]; e,

– Manoel Antônio de Almeida, fazenda Feijão Cru [FC], era sogro de João Gonçalves Neto [R], de João Gualberto [F] e de Antônio Rodrigues Gomes [AV].

Vale recordar que o estudo “200 anos do Registro Civil do Feijão Cru”[1], publicado em 2017, abordou as duas sesmarias doadas aos irmãos Fernando e Jerônimo Corrêa de Lacerda em 1817. Um sobrinho deles, Francisco Pinheiro Correia de Lacerda, teria sido encarregado de vendê-las, o que se confirma no Registro de Terras do Feijão Cru[2]. Tais vendas teriam ocorrido a partir de abril de 1829, data da compra declarada por Antônio Rodrigues Gomes[3] e mesmo ano apontado por Francisco de Paula Ferreira de Rezende como sendo o da chegada de Manoel Antônio de Almeida. Segundo o memorialista, o “comendador” Manoel Antônio de Almeida chegou por aqui[4] em setembro de 1829 “com a família e alguns parentes”.

Importante destacar que a soma da área das propriedades acima indicadas era bem maior do que as duas sesmarias, o que se justifica pelo fato de que os pioneiros compraram terras de vários ocupantes, nem todos sesmeiros, como ficará demonstrado nos próximos textos desta série.

Mas esta carga ficará para a próxima viagem do Trem de História. Até lá!

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA
Publicado na edição 411 no jornal Leopoldinense de 1 de outubro de 2020

Fontes consultadas:
[1] MACHADO, Luja e CANTONI, Nilza. 200 anos do Registro Civil do Feijão Cru. Monografia. Disponível em https://www.academia.edu/34989583/200_ANOS_DO_REGISTRO_CIVIL_DO_FEIJ%C3%83O_CRU out 2017
[2] Registro de Terras de Leopoldina (Arquivo Público Mineiro, Seção Colonial, TP 114)
[3] idem, nr 37.
[4] REZENDE, Francisco de Paula Ferreira de. Minhas Recordações. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1987. p. 392

157 – A Barca do Miranda e o distrito Vista Alegre

É difícil escrever sobre Vista Alegre sem que venha à lembrança a música de Serginho do Rock[1] com seu inspirado refrão: “se você está triste? Vista… Alegre!…” E, sem lembrar a ponte de metal, de onde o cantor sugere que se aprecie o visual.

Estação da Estrada de Ferro Leopoldina

Sacudindo estas lembranças e a saudade da Estação de onde partia a verdadeira Maria Fumaça, que pelo vale do Ribeirão Jacareacanga chegava ao centro de Leopoldina, o Trem de História segue tratando da Fazenda Santana dos Miranda, da Barca do Miranda e de Vista Alegre.

É sabido que Artur Vieira[2] se baseou em livros dos cartórios de notas de Cataguases, o que lhe confere um valor especial por ter utilizado fontes pouco consultadas e conhecidas. E foi em livros também pouco conhecidos, da Câmara de Leopoldina, que informações complementares surgiram. Num deles, dos primeiros anos após a emancipação do Feijão Cru, há referência a uma autorização para construção de barca para transposição do Rio Pomba. A Lei nº 734, de 24.05.1855, oficializou a decisão da Câmara da Villa Leopoldina de autorizar a construção de barca e a cobrança de taxas de acordo com a Lei nº 140. Até aqui, não se encontrou informação sobre o barqueiro nem tampouco sobre o local de aportamento de tal barca.

Ao consultar livros de controle fiscal do armazém da Estrada de Ferro Leopoldina em Campo Limpo (Ribeiro Junqueira), observa-se que no ano de 1880 aquele entreposto recebia produtos vindos de fazendas localizadas no outro lado do Rio Pomba, no então distrito de Laranjal, município de Cataguases. Pesquisando os livros do Registro de Porto Novo do Cunha, para o período 1841-1859, constata-se, ainda, que desde então mercadorias atravessavam o Rio Pomba para serem embarcadas em tropas na margem direita que as levariam até o Porto das Barcas, no Rio Paraíba do Sul, no atual município de Aperibé, RJ.

Sabendo-se, através dos nomes dos fazendeiros, que a produção de Leopoldina e arredores era embarcada[3] no Porto das Barcas até 1870, restava identificar o ponto em que as tropas coletavam estas mercadorias, antes da construção da ferrovia.

A continuação das pesquisas, por referências esparsas, indica como o local possível desta coleta o porto da Barca do Miranda.

O distrito de Vista Alegre

Quanto à criação do distrito de Vista Alegre, no município de Cataguases, Arthur Vieira informa que o distrito policial é de outubro de 1883. Mas Ribeiro Costa[4] deu uma interpretação diferente ao levantar a hipótese de que o distrito não teria sido instalado após a Lei nº 3171 em virtude de sua elevação a distrito policial e de paz ter sido determinada pelo Decreto nº 150 de 21 de julho de 1890.

Segundo Waldemar Barbosa[5], o Decreto nº 406 de 06 de março de 1891 criou o distrito de paz na povoação de Vista Alegre, no município de Leopoldina, localidade por ele não identificada. Já Ribeiro Costa se refere ao mesmo Decreto nº 406 para informar que o distrito no município de Leopoldina não teria sido instalado. Mas é curioso observar que a estação ferroviária de Vista Alegre, no município de Leopoldina, na margem direita do Rio Pomba, é de 1877. O distrito criado no município de Cataguases, na margem esquerda do mesmo rio, é de 1890. E o Decreto nº 406, que trata da criação de um distrito de mesmo nome no município de Leopoldina, é de 1891.

Ficou, então, a dúvida sobre a criação e eventual existência de um distrito de paz no município de Leopoldina com o nome de Vista Alegre. A busca da resposta para esta questão passou por consulta não só à legislação como também a processos judiciais, já que era também antiga a dúvida a respeito da existência de um Engenho Central Aracaty na margem direita o Rio Pomba.

Oras, sabendo-se que o nome remete ao povoado de Aracati, município de Cataguases, natural era entender que tal Engenho tenha funcionado na margem esquerda.

Mas através da análise das divisões e sucessões em propriedades rurais localizadas entre a foz do Rio Pardo no Pomba e a estação de Vista Alegre, foi encontrada resposta para a primeira questão. Sim, o Engenho Central Aracaty foi criado no município de Leopoldina em 1879 e o nome remetia ao município cearense, Aracaty, onde nasceu um dos sócios fundadores do engenho, Teófilo Domingos Alves Ribeiro, casado com Rita, irmã do sócio Custódio Martins da Costa Cruz.

Registre-se que na margem direita do Rio Pomba, na área denominada Circuito, a família de Joaquim José da Costa Cruz se instalara na década de 1850, em terras adquiridas dos herdeiros da fazenda Benevolência e outros confrontantes. Em 1880, promoveram a divisão e demarcação dos então denominados sítios Porangaba e Aracaty, e neste último funcionou o mencionado Engenho Central, contando até mesmo com um pequeno trecho de trilhos para levar a produção até a Estação de Vista Alegre.

Naquele período não foram poucas as referências ao distrito de Vista Alegre, inicialmente entendidas como sendo no município de Cataguases. Até que, em outros processos judiciais de Leopoldina foram encontradas algumas citações como, por exemplo, “sorte de terras em capoeira e matta virgem situadas em Vista Alegre desta Freguesia e comarca”, aqui transcrita como encontrada nos originais. Na década de 1880 Cataguases já havia se emancipado e não mais pertencia à Freguesia nem à Comarca de Leopoldina. Como se justificaria, então, a expressão “Vista Alegre desta Freguesia e comarca” utilizada por escrivães e oficiais de justiça até, pelo menos, 1893?

Como pode deduzir o leitor, a pesquisa continuará. Mas por hoje o Trem de História termina aqui. Na próxima edição ele trará outros Pioneiros de Leopoldina. Aguardem!

Luja Machado e Nilza Cantoni – Membros da ALLA
Publicado na edição 410 no jornal Leopoldinense de 1 de setembro de 2020

Fontes consultadas:
[1] Antônio Sérgio Lima Freire (Serginho do Rock) nasceu no dia 26.10.1940, na chácara dos avós paternos, em Leopoldina-MG. Filho de Antônio Bastos Freire (Tonico Bastos) e de Marília de Lima Freire (Sinhazinha). Hoje Serginho do Rock é patrono da cadeira nº 9 da Academia Leopoldinense de Letras e Artes – ALLA.
[2] SILVA, Arthur Vieira de Resende O Município de Cataguazes. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, v. 13, 641-1028, ano 1908. p. 905
[3] Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro. Registro do Porto Novo do Cunha 1841-1842 e 1859; Registro da Barra do Pomba, 1860; Fundo Presidência da Província do Rio de Janeiro, Notação 439, 1864; Registro do Campo Limpo, 1880.
[4] COSTA, Joaquim Ribeiro. Toponímia de Minas Gerais. Belo Horizonte, Itatiaia, 1993. p.424
[5] BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário Histórico Geográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia,1995.