
Recreio, MG: Provável limite do povoado

Trabalhador de ferrovias.
Recreio nasceu nos anos finais do Império do Brasil e talvez seja adequado dizer que foi uma “cidade da ferrovia”. Não teria havido uma intenção direta em sua fundação. Ela foi formada a partir de uma estação da estrada de ferro construída para escoar a produção agrícola. Cremos não ser adequado defini-la como “cidade do café” porque, ao tempo em que a estrada passou a operar efetivamente, um outro objetivo tinha sido agregado à ferrovia: transportar os imigrantes que vinham substituir o braço escravo.
De todo modo, nada nos é lícito afirmar sobre as intenções de Ignacio Ferreira Brito ao conceder o direito de uso das terras de sua Fazenda Laranjeiras aos primeiros moradores do que se denominou Arraial Novo. Entre eles, JOSÉ VAZ DA SILVA, empregado da Estrada de Ferro da Leopoldina, ocupava “uma casa térrea coberta de telhas que devide pela frente com a Estação, pela direita e esquerda com terrenos dos outorgantes, e pelos fundos com cafezais dos outorgantes”. O terreno com 10 metros e 70 centímetros por 10 metros de fundos, assim como a casa nele construída por Ignacio Ferreira Brito, foi aforado no dia 9 de abril de 1885 por 36.380 réis anuais.
Conforme se observa, os terrenos variavam bastante de tamanho. Provavelmente não foi planejado um loteamento no entorno da Estação e as ocupações teriam sido autorizadas na medida da necessidade de acomodar os operários da construção da ferrovia e os prestadores dos serviços essenciais.
Segundo Michael Pollak em Memória, Esquecimento e Silêncio, “a referência ao passado serve para manter a coesão dos grupos” e defender “as fronteiras daquilo que um grupo tem em comum, aí incluídos o território e os personagens” que construíram a história do próprio grupo. Em outro texto, discorrendo sobre a identidade individual e social o mesmo autor lembra que a memória tem papel preponderante na (re)construção da identidade, sendo “constituída por pessoas, personagens, acontecimentos e lugares”.
Baseando-nos neste sociólogo austríaco, não podemos deixar de lembrar que é dele o conceito de “personagens freqüentadas portabela”, ou seja, aqueles que nós não conhecemos pessoalmente por não pertencerem ao nosso “espaço-tempo”. Entretanto, ao sermos informados sobre suas trajetórias, transformamos estes personagens em partícipes de nossa identidade social. E é assim, com o objetivo de recuperar para a memória coletiva os seus componentes fundamentais, é que seguimos falando dos acontecimentos, dos lugares e dos personagens que escreveram os primeiroscapítulos da história de Recreio.
Nos primórdios do então Arraial Novo, a casa de Miguel Bento Borba avizinhava-se, pela direita, com benfeitorias do morador José Fernandes Júnior, outro foreiro das terras da Fazenda Laranjeiras. Da mesma forma que os demais moradores, no aforamento consta que ele já ocupava, com autorização de Ignacio Ferreira Brito, um terreno junto da Estação.
José Fernandes Júnior vivia em uma “casa térrea, coberta de telhas, que divide e confronta pela frente com a pequena rua que dá acesso à Estação e pelos fundos com a linha férrea do Alto-Muriahé”. Segundo o registro, o terreno media 29 metros e 70 centímetros por 19 metros e 50 centímetros, resultando num foro anual de 196.911 réis, calculado na base de 340 réis por metro quadrado.