Pesquisando a origem de Antônio de Almeida Ramos, na tentativa de descobrir um pouco sobre sua vida antes de passar ao Brasil, entramos em contacto com o vigário da Freguesia do Espírito Santo do Landal, Freguesia do Espírito Santo, Concelho de Óbidos, Lisboa, Portugal. Por indicação do Padre, passamos a trocar correspondência com moradora de Caldas da Rainha, autora de um livro sobre a Câmara de Oliveira do Bairro e outro sobre a Freguesia do Espírito Santo do Landal. O que se verá a seguir é um resumo das informações recolhidas até agosto de 2001. Por volta de 1740 passaram ao Brasil três jovens portugueses, nascidos na Freguesia do Espírito Santo do Landal, então Termo e Concelho de Óbidos, hoje Concelho de Caldas da Rainha. Foram eles: 1 – Antonio de Almeida Ramos, nascido entre 1722 e 1737; 2 – Agostinho de Almeida Ramos, nascido entre 1700 e 1730; 3 – Francisco Farto de Almeida, nascido entre 1715 e 1735. Os dois últimos eram filhos de Francisco Farto e Maria Almeida, parentes próximos. O pai do primeiro, nosso biografado, era primo e cunhado de Francisco Farto, pois era irmão de Maria Almeida. A mãe de nosso biografado, Teresa Maria, era também parente de Francisco Farto. A pesquisadora portuguesa escreveu:
Nossa correspondente fez diversos contactos com o Arquivo Nacional na Torre do Tombo, não tendo tido sucesso nas buscas de demais documentos. Fez também um “Aviso aos Moradores”, que foi colocado na Igreja do Espírito Santo, pedindo aos paroquianos que enviassem informações a respeito dos três jovens portugueses e suas famílias. Além disso, ela guarda uma cópia do tombo dado em 1742 a uma parte das terras da Comenda e um manuscrito de seu próprio pai, com dados dos livros antigos, antes de os retirarem em 1834, para a Provedoria de Torres Vedras. Eis os nomes de Capitães da Ordem de Malta por ela apurados:
– Manoel Ramos – casou, em 1694, com D. Victoria Maria de Seixas; – Pedro Manoel Ramos – que mandou erigir a ermida dos Ameais; – Alexandre de Abreu Velho Coutinho – casou, em 1750, com D. Teresa Maria de Seixas Abreu e Oliveira; – João Rebelo – falecido em 1769; – Domingos Rodrigues de Oliveira – falecido em 1796; – Correia Fialho Lobo da Silveira – família conhecida de Alenquer, freguesia próxima; – Antonio Manoel de Seixas, que foi testemunha no tombo dado a algumas terras da Comenda, em 1742. Promotores do tombo: – Juiz, Dr. Félix Francisco da Silva; – Vigário, Frei Domingos de Almeida; – Escrivão, José Leonardo de Seixas; – Delegado da Comenda, João Almeida; – Porteiro, Antonio dos Reis; – Testemunhas, Capitão de Malta Antonio Manoel de Seixas e Frei Doutor João de Abreu e Oliveira (que , em 1759, veio a ser Vigário da Igreja Paroquial do Espírito Santo do Landal Escreve ainda a pesquisadora:
Outros dados fornecidos pela pesquisadora portuguesa referem-se à população da Freguesia do Espírito Santo do Landal: 1527 – 135 moradores; 1759 – 263 moradores; 1960 – 1483 moradores; 1981 – 1331 moradores; 1999 – 1800 moradores. Desta forma, embora sem termos descoberto muitos dados sobre os três jovens, pudemos conhecer um pouco sobre a região de origem de Antonio de Almeida Ramos, Agostinho de Almeida Ramos e Francisco Farto de Almeida. Já nos arquivos brasileiros conseguimos verificar a presença dos nomes destes portugueses em diversas fontes. Numa delas, o Abecedário dos Moradores da Comarca do Rio das Mortes, documento da Coleção Casa dos Contos arquivado na Biblioteca Nacional, levantamos os moradores da Comarca que, de alguma forma, se vinculam aos povoadores de Leopoldina. Esclareçamos que este documento é um conjunto de cinco cadernos tamanho ofício sem pauta, onde são listados os moradores de cada região da comarca. Até o momento não foi possível, a nenhum historiador, especialista ou técnico em grafoscopia, identificar a data em que a listagem foi organizada. No entanto, considerando que o primeiro caderno informa que seu autor foi Joaquim Silvério dos Reis, e sabendo que tal personagem arrematou o contrato das entradas entre 1782 e 1784, tendo permanecido no controle da arrecadação até 1792, pode-se inferir que ali constam os pagantes de tributos desta época. Também não se tem notícia de qual foi a fonte utilizada para a organização da listagem. Admite-se que, ao tomar posse, Silvério dos Reis utilizou-se de livros de controle de arrecadação do quinto do ouro e deles extraiu os nomes dos que haviam sido fiscalizados no período próximo precedente. Acrescente-se que alguns nomes poderão ter sido acrescentados com base no movimento do Registro entre 1782 e 1792. Ao lado de cada nome é informado um número, sem que alguém até então tenha descoberto a que se refere. Há os que aventam a hipótese de ser o número da página onde foi efetuado o lançamento do débito daquele morador. Os mais altos algarismos são inferiores ao número total de páginas que habitualmente compunham os livros de registro então utilizados. Nestes “cadernos” apuramos que, entre os moradores do Caminho Novo estavam os seguintes personagens, todos com descendentes em Leopoldina: Antonio d’Almeida Ramos, Antonio Joaquim de Ávila, Antonio Roiz da Fonseca, Antonio Roiz Gomes, Bernardino Coelho Gomes, Domingos Gonçalves Pereira Chaves, Domingos Roiz Chaves, Francisco Xavier da Fonseca, Joaquim José da Fonseca e Tomaz Ferreira de Aquino. Sob o código I – 10, 6, 3, nº 4, sem menção ao autor e com caligrafia algo distinta do anterior, encontramos na Biblioteca Nacional a lista dos moradores do L4, como era então designada a região que tomava São João del Rey por sede. Neste caderno foram listados os moradores de São João del Rey, Lavras do Funil, São José do Rio das Mortes, Prado, Tamanduá, Borda do Campo, Caminho Novo do Mato, Santa Ana do Bambuí e Baependi. A organização é um pouco confusa, já que os moradores são divididos por seus locais de moradia e a ordem alfabética não é rigorosa. Numa análise um tanto superficial, localizamos apenas Felisberto da Silva residente em São José del Rey e dois moradores da Borda do Campo que nos interessam: Felix Gonçalves da Costa e Felix de Oliveira Braga. E sob o código I – 10, 6, 3, nº 5, encontramos o caderno contendo as listas de moradores do L5 da Comarca do Rio das Mortes. Refere-se às localidades de Aiuruoca, Pouso Alto, Campanha do Rio Verde e Ouro Fino, Jacuí, Itajubá, Congonhas do Campo, Carijós e Itaverava. Para nossa surpresa, e sem que tivéssemos nos detido na análise cuidadosa dos nomes, na primeira página encontramos os moradores Agostinho de Almeida Ramos e Antonio Gonçalves da Costa, ambos de Aiuruoca. Com o objetivo de a conferir o encontrado com outros documentos, pesquisamos a carta de Brás Álvares Antunes a Antonio Mendes da Costa, informando ter recebido a lista de 28 créditos do Registro do Caminho Novo e o envio da lista do Registro da Mantiqueira, de 06.10.1776. Em outra carta do mesmo remetente, endereçada a João Rodrigues de Macedo, há referência ao envio da lista de créditos do Caminho Novo, de 27.11.1777. Esta carta faz menção a um provável anexo, nomeado como “Lista 18, 24 credores”. Infelizmente porém, não há notícias desta “Lista 18”. Há uma série de outros documentos da Coleção Casa de Contos que poderão conter anexos como o citado na carta retro mencionada. Até que prossigamos neste assunto, deixamos registrada nossa impressão, tal qual o fizemos no competente livro de registros: os três jovens provenientes do Concelho de Óbidos aparecem entre os contribuintes registrados na segunda metade do século XVIII, bem como no Abecedário de Moradores da Comarca do Rio das Mortes. Mas como era a região onde passaram a viver depois de deixar a terra natal? Preparar a MudançaReferências às impressões dos viajantes estrangeiros que estiveram em Minas no século XIX nos dão oportunidade de nos aproximarmos do pensamento vigente na época em que nossos ancestrais portugueses trilharam os caminhos da nossa terra. Quando publicamos o opúsculo que ora revisamos, havíamos consultado antigas edições dos relatos de John Mawe, Auguste de Saint-Hilaire, Jean Louis Agassiz e Richard Burton. Ao nos propormos a revisar nosso texto, buscamos edições mais recentes que pudessem, eventualmente, esclarecer pontos obscuros nas traduções consultadas. Além dos destaques da primeira edição, decidimos acrescentar trechos que nos passaram despercebidos na primeira leitura. Um deles é a descrição do tipo mineiro, segundo Burton (2001, p. 463): O mineiro – no sentido do homem cujos antepassados, ou, pelo menos os pais, nasceram na região – é facilmente reconhecido, mesmo entre os brasileiros, e suas peculiaridades não podem ser explicadas “pela bazófia e pelo culto do dólar”. É um tipo alto, magro, ossudo, que, quando exagerado, representa nosso popular D. Quixote esguio e macilento. Não há necessidade do “batismo intelectual”, da inervação, vulgarmente chamado “sangue”. O arcabouço é musculoso e bem adequado à atividade; é reto como o do basco, e não semelhante ao do sargento instrutor e mesmo os trabalhadores não costumam curvá-lo, como nossos camponeses de ombros abaulados. O pescoço é comprido e a laringe proeminente; ao tórax freqüentemente falta espessura. Os quadris e a pelve são, em geral, estreitos; as juntas, punhos e calcanhares, finos, e as pernas, como acontece muitas vezes entre as raças latinas, não são proporcionais aos braços na força. A obesidade é rara, como é entre os verdadeiros persas; ocasionalmente aparece em homens de idade avançada e é considerada como diabetes nullo curabilis. O português, baixo, quadrado e robusto, ossudo e muscular, não é raro, contudo. […] Muitas das mulheres têm formas cheias e arredondadas, que chegam aos extremos mais tarde, tornando-as gordas, por vezes excessivamente. Não poucas possuem aquela beleza frágil, graciosa e delicada, que todos os estrangeiros notam nas cidades da União. Assim como disséramos na primeira vez em que levamos a público este artigo, cremos ser dispensável entrar em detalhes antropométricos, já que muito do que se escreveu sobre nossos ancestrais é hoje contestado por novos estudos científicos. Parece-nos, entretanto, ainda não ter sido questionada a impressão de fisionomia séria do mineiro, um apreciador de exercícios físicos. Por outro lado, a idéia dos viajantes estrangeiros de que o mineiro tinha espírito nômade, sempre viajando em busca de novos locais a desbravar, suscita algumas reflexões ao nosso olhar, viventes da última metade do século XX. Em todos os nossos escritos temos chamado a atenção para o risco de uma postura anacrônica, levando para a realidade dos nossos ancestrais a experiência adquirida em nossa própria estadia no planeta. Assim é que, muitas vezes, nossos interlocutores insistem em argumentar que os pioneiros abandonavam a casa dos pais porque ali faltava o pão. Não é, já o dissemos em várias oportunidades, a nossa opinião. Lendo os diários dos europeus que por aqui estiveram no século XIX, ficamos sabendo que o mineiro andava a cavalo desde tenra idade, apoiando apenas uma parte do pé no estribo porque acreditavam que assim a viagem seria menos cansativa. E qual o motivo de tantas viagens? Acreditamos que, na busca de suprimentos que tornassem mais fácil a vida em suas fazendas, o mineiro também se demorava em incursões verificadoras, expressão que criamos para significar as viagens que os fazendeiros faziam pelo interior das matas, seguindo caminhos indicados pelos tropeiros. Para os interessados, sugerimos nosso texto sobre Tropas e Tropeiros, em nosso Caderno 3: Os Moradores do Caminho Novo (CANTONI, 1976). Um outro aspecto a considerar entre os hábitos de nossos antepassados, é a forma como se vestiam. Sabemos que o consumo exagerado de peças do vestuário, tão comum atualmente, bem longe está da realidade daqueles que povoaram os rincões mais distantes de Minas Gerais. Tendo abandonado os trajes habituais em seus lugares de origem, por inadequados ao clima da terra que escolheram por moradia, o mineiro do século XVIII vestia-se com simplicidade e acumulava um pequeno número de peças de roupa durante a existência, sendo comum um conjunto escuro para as tarefas mais pesadas e roupas mais claras para ocasiões formais. Indicamos outro de nossos textos, As Tecelãs de Ibitipoca (ALMEIDA, 1972) para o que se refere ao vestuário mais usual entre as famílias antigas. Lembramos ainda, que eram considerados pertences pessoais os arreios de prata, as esporas, as rosetas, um chapéu alto para as solenidades, o chapéu panamá para o cotidiano e as botas de cano longo que os protegiam de ataques dos animais rastejantes. Como o objetivo deste texto é abordar as incursões de nossos antepassados, que os levaram a ocupar terras desabitadas, queremos ressaltar um aspecto importante da vida em família. Burton (2001, p. 478), citou uma de suas interlocutoras para declarar que, assim como para a mulher mexicana, para a mineira o baluarte de parentes pelo qual a jovem esposa é cercada serve, em grande parte, para protegê-la; independente disso, porém, acho-a quase sempre retraída e recatada, chegando mesmo ao puritanismo, quando os estranhos se mostram audaciosos. Seus casamentos são realmente domésticos e felizes; os cônjuges são sempre vistos juntos e o marido costuma oferecer presentes à mulher, o que é considerado como uma prova especial de afeição. Convido-os, pois, a imaginarem como seria a preparação de uma viagem que levaria um casal, seus filhos, escravos e pertences para se estabelecerem em algum lugar escolhido para fixarem nova residência. No próximo capítulo, vamos trazer informações de vários autores sobre os locais onde se instalaram. Impressões de ViagemNa reunião de família do ano passado, um grupo de parentes insistiu em buscar explicações para o nosso interesse em conhecer tantas cidades mineiras, pequenos lugarejos nos quais muitas vezes não conseguimos, sequer, obter uma imagem que nos ajude a fixar na memória alguma impressão local. Uma das nossas dificuldades é reproduzir as poucas fotografias que fizemos nestas nossas viagens. Por esta razão, e sabedores da nossa pouca possibilidade de descrevê-las adequadamente, buscamos em autores consagrados aquilo que acreditamos sejam relatos bem próximos do que existia na época em que os Almeida Ramos espalharam-se pela terra mineira. Ao relatar suas primeiras impressões dos arredores do Rio de Janeiro, Agassiz (2000) nos dá uma imagem saborosa da paisagem e também dos percalços pelos quais passaram. Considerando que sua estadia em nosso país ocorreu um século depois da chegada dos jovens de Óbidos, é fácil imaginar quão mais difícil teria sido a viagem daqueles rapazes em solo nacional. Por outro lado, os hábitos observados pelos americanos Agassiz nos fazem supor que a tão decantada hospitalidade nasceu justamente das dificuldades de sobrevivência. Voltemo-nos ao diário de Elizabeth Agassiz para tentarmos fazer um paralelo com as providências que teriam sido tomadas pelos descendentes de nossos personagens, quando decidiam sair da casa de seus pais para formar suas próprias fazendas. Diz a autora que a casa sede das fazendas normalmente tinha apenas um andar em um edifício comprido e de grande extensão. Por estarem totalmente isoladas e afastadas de outras habitações, era necessário fazer provisão de todo o necessário, gerando hábitos primitivos como o que lhe foi contado por um de seus anfitriões. O caso teria ocorrido com rica marquesa que pernoitara na fazenda, no trajeto de uma viagem de poucas semanas até a Corte. Para tanto, a ilustre figura vinha acompanhada de uma tropa de “trinta e uma bestas de carga conduzindo toda a bagagem imaginável, sem contar as provisões de toda espécie, galinhas, presuntos, etc. e vinte e cinco criados a acompanhavam.” (AGASSIZ, 2000, p. 73) Isto, para uma viagem relativamente curta ao fim da qual estaria instalada em residência que contava com o conforto possível na época. Descrições desta natureza nos fazem compreender que a organização de uma viagem era empreitada bastante complexa, envolvendo um sem número de providências inimagináveis nos dias atuais. Em meados do século XIX, os viajantes estrangeiros observaram que bastava alguém se apresentar numa fazenda ao fim de um dia de jornada e, se a aparência não fosse má, os proprietários o receberiam cordialmente, oferecendo-lhe alimentos e um quarto para repousar. De modo geral, o viajante municiava-se de uma carta de recomendação para facilitar a acolhida. Isto, quando estava em viagem. Mas como seria a viagem de mudança, em que toda a família se transferia para outro lugar? Evidentemente que o status econômico era determinante, sendo possível identificar as posses de uma família pela quantidade de bagagem que a tropa de mudança conduzia. Por outro lado, os menos aquinhoados não decidiam, por si sós, pela mudança de residência. Antes, pelo contrário, famílias mais simples só saíam de um local quando agregadas aos grandes proprietários que, eles sim, tomavam a decisão de abrir novas frentes de ocupação. Pelo que nos foi dado apurar até o momento, os Almeida Ramos inscreviam-se na categoria daqueles que possuíam alguns bens e organizavam as expedições de mudança, levando para outros pontos os seus pertences, escravos e agregados. É ainda Agassiz (2000) quem lembra que os percursos eram realizados através de trilhas estreitas, esburacadas e com variados níveis de risco. Ao longo da ocupação das vias transitáveis, foram criadas “estações de troca”, nas quais o viajante fazia uma pequena parada e trocava seus animais por outros descansados. Entretanto, as migrações internas dos Almeida Ramos não parecem ter sido feitas pelos caminhos descritos pelos viajantes estrangeiros. Acreditamos mesmo que foram pioneiros na abertura de novas vias de ocupação. E tornaram-se conhecedores de paisagens que assombraram não poucos estudiosos, como ocorreu a Agassiz (2000, p. 86), “perplexo e muito embaraçado com o aspecto inteiramente novo de fenômenos que lhe são bastante familiares noutras regiões, mas que, nessas montanhas, o desconcertavam completamente.” Neste ponto pedimos permissão para remeter nossos leitores a uma obra recentemente reeditada, na qual tivemos oportunidade de confirmar a forte impressão que nos causaram as casas de cupim que vislumbramos em diversos trechos de nossas incursões pelas terras onde outrora viveram os Almeida Ramos. Na visão de Burton (2001, p. 85), as casas de cupim são “grandes colunas ou pirâmides de barro, amarelas ou pardacentas, de acordo com a terra, e chegando às vezes, a uns dois metros de altura”. Assim como observou este naturalista inglês, lembram túmulos, espalhando-se aos pares ou em grupos maiores. Mesmo das atuais estradas de rodagem, não nos escapa a visão dos cupinzeiros que chamaram a atenção do viajante estrangeiro, parecendo abandonados. Entretanto, ensina-nos Burton que, quando abertos, “parecem um hotel monstruoso, tal como Asmodeus o veria, e bastam alguns golpes decididos com uma picareta sobre a dura crosta desses cupinzeiros que parecem desertos, para se ver sair de seu interior uma multidão tão frenética quanto os hóspedes de um hotel que fogem ao grito de ‘Fogo!’.” Mas os estudiosos também nos ensinam que os cupinzeiros não prejudicam sobremaneira os fazendeiros, já que encontram inimigos naturais no solo onde tentam vicejar. Fica-nos o questionamento: estavam os nossos ancestrais habilitados a contornar os males causados ao solo pelos cupinzeiros, assim como pelas formigas e demais partícipes de seu modus vivendi? É ainda de Burton que extraímos, sobre a vida no cupinzeiro: Não se trata, contudo, de uma família feliz, se se leva em conta que o sapo, depois de comer o cupim, é comido pela cobra, e a cobra comida pela seriema, uma ave cujo gosto coincide com o Gypogeranus africanus, mas falta-lhe a caneta atrás da orelha que fez os holandeses dar-lhe denominação tão literária. Há, também, quem acredite que os cupins novos são aprisionados e escravizados, como africanos ocidentais, pela maldosa e impiedosa formiga das fazendas, que representa, assim, o maldoso e impiedoso homem branco. (BURTON, 2001, p. 86) SebollasIniciemos nosso percurso por Santana de Sebollas, um pouco antes de adentrarmos a terra mineira. Lá estivemos enquanto pesquisávamos sobre uma família que, naquela época, pensávamos ter ligações com os Almeida Ramos. Sabíamos que ali Carlos José de Santana, filho de José Joaquim de Santana e Maria Rosa de Jesus, casara-se em junho de 1877 com Emilia Francisca Gonçalves, filha de Antonio Joaquim de Santana e Francisca Maria de Jesus. Suspeitávamos que este casal tivesse vínculos com Joaquim Farto de Almeida, um dos netos de Francisco Farto, filho de outro do mesmo nome. Joaquim Farto nasceu em 1754 em Santa Rita de Ibitipoca e teve, pelo menos, os filhos Jacinta (1781), Teodora (1783), Francisco (1788), Joaquim (1792) e Carlos Gomes de Almeida, nascido em Conceição de Ibitipoca em 1797.
Nossa viagem a Sebollas não trouxe o resultado esperado, já que os livros paroquiais encontravam-se em outra localidade onde estivemos mais tarde. Entretanto, o resultado de nossas leituras levou-nos a concluir que, embora não havendo vínculos familiares no local, certamente os três rapazes de Óbidos passaram por Sebollas. Além do que já houvéramos apurado em Abreu (1975), a recente obra de Santos (2001) nos faz acreditar que nossos ancestrais estiveram naquele pouso antes de seguirem viagem para Minas. Seguindo em direção a Minas, nossos rapazes portugueses provavelmente se depararam com o ambiente descrito mais de cinqüenta anos depois por Saint Hilaire (1975, p. 47): A paisagem que se apresenta aos olhos do viajante quando este entra na Comarca do Rio das Mortes, às margens do Paraibuna, tem algo que impressiona por um misto de desordem e regularidade selvagem. Por toda a parte o rio é dominado por montanhas elevadas; como ele descreve uma volta antes de chegar ao registro, não se vislumbra por esse lado mais que uma pequena parte do seu curso, e dá a impressão de ;que todo ele começa na base de uma montanha mais alta que as outras, e cujo cume absolutamente nu contrasta com a vegetação vigorosa dos morros vizinhos. Nosso percurso para conhecer o provável caminho de entrada em Minas não obedeceu à mesma ordem em que aparece em Saint Hilaire. De Sebollas fomos à Paraíba do Sul e dali rumamos para São José das Três Ilhas. Iniciemos nosso percurso por Santana de Sebollas, um pouco antes de adentrarmos a terra mineira. Lá estivemos enquanto pesquisávamos sobre uma família que, naquela época, pensávamos ter ligações com os Almeida Ramos. Sabíamos que ali Carlos José de Santana, filho de José Joaquim de Santana e Maria Rosa de Jesus, casara-se em junho de 1877 com Emilia Francisca Gonçalves, filha de Antonio Joaquim de Santana e Francisca Maria de Jesus. Suspeitávamos que este casal tivesse vínculos com Joaquim Farto de Almeida, um dos netos de Francisco Farto, filho de outro do mesmo nome. Joaquim Farto nasceu em 1754 em Santa Rita de Ibitipoca e teve, pelo menos, os filhos Jacinta (1781), Teodora (1783), Francisco (1788), Joaquim (1792) e Carlos Gomes de Almeida, nascido em Conceição de Ibitipoca em 1797. Nossa viagem a Sebollas não trouxe o resultado esperado, já que os livros paroquiais encontravam-se em outra localidade onde estivemos mais tarde. Entretanto, o resultado de nossas leituras levou-nos a concluir que, embora não havendo vínculos familiares no local, certamente os três rapazes de Óbidos passaram por Sebollas. Além do que já houvéramos apurado em Abreu (1975), a recente obra de Santos (2001) nos faz acreditar que nossos ancestrais estiveram naquele pouso antes de seguirem viagem para Minas. Sebollas é o atual distrito de Inconfidência, cujo núcleo urbano fica a cerca de 20 km da sede municipal em Paraíba do Sul. A localidade entrou para a história do Brasil por ter servido de pouso ao alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, que dá nome ao atual Museu Sacro e Histórico de Inconfidência. Suas construções mais antigas datam do século XIV. Seguindo em direção a Minas, nossos rapazes portugueses provavelmente se depararam com o ambiente descrito mais de cinqüenta anos depois por Saint Hilaire (1975, p. 47):
Resolvemos então pesquisar as Cartas de Sesmaria e encontramos uma de 09 de dezembro de 1818, concedendo terras na Paragem de São Roque de Monte Verde, Freguesia de Simão Pereira, Termo de Barbacena a Carlos Gomes da Fonseca. Estava resolvida nossa principal dúvida, já que o beneficiário era filho do português Carlos Gomes Monteiro e Antonia Maria de Jesus e portanto irmão de Joaquim Gomes Monteiro, este último pai de Zeferino Antonio Gomes da Fonseca que foi pai de Teresa Maria. Necessário se torna esclarecer que a visita a Três Ilhas tinha sido motivada por pesquisas em torno da família Fonseca, que só mais tarde descobrimos ter descendentes em diversas famílias leopoldinenses. O curioso é que em assentos religiosos relativos a membros da família Fonseca, algumas vezes é informado que moravam na Fazenda Reserva e outras vezes na Fazenda São Roberto. Segundo José Rodrigues de Magalhães Alves, oficial substituto do Cartório de Três Ilhas, a Fazenda São Roberto foi construída pelo terceiro avô dele, Francisco de Assis Alves, localizada em território hoje pertencente ao distrito de Porto das Flores. Não logramos êxito na busca da Carta de Sesmaria que teria dado origem à Fazenda São Roberto. Suspeitamos que as duas fazendas fossem vizinhas e a Reserva estaria localizada nas proximidades da atual divisa entre Santa Bárbara do Monte Verde e Belmiro Braga. A seguir, decidimos pesquisar um pouco sobre a história de Simão Pereira, a mais antiga freguesia daquela região. Simão PereiraA paisagem que se apresenta aos olhos do viajante quando este entra na Comarca do Rio das Mortes, às margens do Paraibuna, tem algo que impressiona por um misto de desordem e regularidade selvagem. Por toda a parte o rio é dominado por montanhas elevadas; como ele descreve uma volta antes de chegar ao registro, não se vislumbra por esse lado mais que uma pequena parte do seu curso, e dá a impressão de ;que todo ele começa na base de uma montanha mais alta que as outras, e cujo cume absolutamente nu contrasta com a vegetação vigorosa dos morros vizinhos. Nosso percurso para conhecer o provável caminho de entrada em Minas não obedeceu à mesma ordem em que aparece em Saint Hilaire. De Sebollas fomos à Paraíba do Sul e dali rumamos para São José das Três Ilhas. São José das Três IlhasTodas as localidades por onde passa o rio do Peixe já foram objeto de nossos olhares, uma vez que nelas residiram os antepassados dos povoadores de Leopoldina. Conta a história que no Sítio de Simão Pereira foi criada a freguesia de Nossa Senhora da Glória em 1718. Vejamos como descreveu Cunha Matos, em obra publicada em 1837. Grande distrito paroquial cuja igreja matriz existe na estrada do Rio de Janeiro para Barbacena, na margem esquerda do Rio do Barros, braço setentrional do Paraibuna, em terreno muito baixo na fralda de uma alta serra, ramo da Mantiqueira. A pequena distância da igreja existe uma humilde casa em que mora o vigário, e na serra fronteira há outra ainda menor, proporcionando, aliás, o terreno as melhores comodidades para uma grande povoação. Dista 35 léguas do Rio de Janeiro, e 43 da cidade do Ouro Preto. Recebeu o nome de Simão Pereira por se achar próxima do lugar em que um homem assim chamado estabeleceu fazenda que ainda se apelida “Sítio do Simão Pereira”. Fica ao norte de outro lugar conhecido pelo nome de Rocinha de Simão Pereira, ambos na estrada real. O distrito próprio de Simão Pereira, dista 23 léguas da cabeça do termo. Tem 98 fogos e 964 almas. Diz ainda Cunha Matos que a paróquia era também conhecida pelo nome de Simão Pereira do Caminho Novo. A Freguesia de Nossa Senhora da Glória do Sítio de Simão Pereira era o primeiro povoado de Minas. Mas, para descrever aquele trecho do Caminho Novo com maior proximidade no tempo, utilizaremos trechos do diário de Saint-Hilaire. Auguste de Saint-Hilaire, cientista francês que viajou pelo interior do Brasil entre 1816 e 1822, deixou-nos preciosas informações sobre o Brasil do início do século XIX. A Segunda Viagem de Saint-Hilaire a Minas começou a 29 de janeiro de 1822, no Rio de Janeiro. No dia 6 de fevereiro entrou em território mineiro. Eis parte de seu relato do dia:
Seis dias depois o cientista estava acomodado em uma granja no “Rancho de Manoel Vieira” e seu relato volta a mencionar características da paisagem. Já tendo passado pela “Serra Negra”, informa que todo o percurso é um subir e descer muito cansativo. Sobre o Rio do Peixe que atravessara “um quarto de légua” antes, diz apenas; “passamos, sobre uma ponte de madeira, o pequeno rio chamado Rio do Peixe e pelo percurso vimos várias fazendas”. Já no relato de sua primeira viagem Saint-Hilaire declarou-se impressionado com o que chamou de “misto de desordem e regularidade selvagem”, com a atenção voltada para “as montanhas que se misturam no horizonte e fazem pensar que o rio nasce na elevação posterior à que primeiro se avizinha” quando, ao passar posteriormente por ela, constatou que as águas vinham de um ponto bem mais distante. Século e meio depois o grande poeta Carlos Drumond de Andrade nos brindou com suas fortes impressões das montanhas de Minas. Antes de prosseguirmos, transcrevemos mais um trecho da primeira viagem.
Em nota do próprio autor ao texto acima, ficamos sabendo que ele foi recebido de maneira muito cordial em Vargem e que por isso faz questão de denunciar um outro viajante estrangeiro que teria sido tão bem recebido quanto ele e que, no entanto, depois teria “vilipendiado” o hospedeiro. Santa Bárbara do Monte VerdeSeguindo o percurso inverso ao que julgamos ter sido realizado pelos Almeida Ramos, visitamos Santa Bárbara do Monte Verde em duas oportunidades. Não logramos êxito na busca da fazenda que pertenceu ao Barão de Santa Bárbara, personagem que acreditávamos descender de Antonio de Almeida Ramos. Muitas foram as nossas buscas em Santa Bárbara do Monte Verde, bem como na documentação relativa àquele município que se encontra no Arquivo Público Municipal de Juiz de Fora. Mas foi somente neste ano de 2007 que, com a ajuda do pesquisador Júlio Sales Moreira, tivemos êxito na confirmação de nossa hipótese: descendentes de Antônio de Almeida Ramos deixaram a região da Serra da Ibitipoca no início do século XIX, vindo povoar os atuais municípios de Santa Bárbara do Monte Verte e Rio Preto. O quinto filho de Antônio de Almeida Ramos e Maria de Oliveira Pedrosa foi João de Almeida Ramos, batizado em Santa Rita de Ibitipoca no dia 16 de abril de 1769. Casou-se a 3 de março de 1794, em Santa do Garambeo, com Teresa Maria de Jesus, filha do açoriano Manoel José do Bem e de Teresa Maria de Jesus. Ressalte-se que Teresa era filha do português Inácio Franco e da ilhoa Maria Tereza de Jesus. Portanto, a esposa de João de Almeida Ramos tinha relação de parentesco com ancestrais de grande parte da população de Leopoldina. João de Almeida Ramos e Teresa Maria de Jesus foram pais de Francisco, Rita, Manoel Antonio de Almeida Ramos, João de Almeida Ramos Filho, Ana Bernardina de Almeida e Maria Teresa. Destaque-se que Ana Bernardina de Almeida casou-se com Manoel Rodrigues da Silva, formador da fazenda Puris no então Curato de São Sebastião do Feijão Cru. Também por João de Almeida Ramos Filho, que se casou com Joaquina Felisbina de Jesus, vamos encontrar descendentes em Leopoldina no século XIX. Mas as nossas viagens a Santa Bárbara tinham sido motivadas pelo terceiro filho de João de Almeida Ramos Tantos anos depois de nossas buscas, Júlio Sales Moreira ofereceu-nos cópias de documentos que esclareceram definitivamente a questão. Através de um Titular do Império – o Barão de Santa Bárbara, o Júlio colocou um ponto final na questão. O Barão, cujo nome foi João Evangelista de Almeida Ramos, era filho de Manoel Antônio de Almeida Ramos e Joana Tereza do Espírito Santo. Era, portanto, sobrinho neto do nosso Manoel Antônio de Almeida e bisneto de Antônio de Almeida Ramos.
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